quinta-feira, 30 de abril de 2009

O termidor


Todo mês eles apareciam do nada... distribuíam alguns panfletos incendiários... falavam vagamente sobre fazer uma greve... pregavam mentiras deslavadas sobre aumentos que levariam nossos vencimentos às alturas... contavam uma fofoca vexatória sobre algum juiz... distribuíam tapinhas nas costas... bebiam do nosso café... e saíam sorrindo, repetindo a mesma nojenta saudação: "tchau pessoal, até a próxima"...

Eram os frouxos do Sindicato...

Vagabundos odiados pela grande maioria dos burocratas...

Há quem diga que todos nutrem uma inveja por esses homem e mulheres mal vestidos, que aparecem mensalmente nos panfletos sindicais apertando a mão de algum deputado babão...

E é possível que seja mesmo inveja o que todos sentem...

Afinal, a chapa eleita fica isenta de bater ponto durante todo o mandado... Faça idéia do que eles aprontam enquanto a maioria dos burocratas estão trancafiados numa Repartição mofada, escura, sujeitos à programação da rádio Antena 1 durante todo o expediente...

Os do Sindicato são apelidados "vagabundos duplos"; "burocratas biônicos"; "borra-botas"; "os da-lua"; ou simplesmente "zeros à esquerda"

Mas nem sempre foi assim

Quando o presidente do Sindicato era o Sr. M tudo era diferente...

Homem de idade, barriga, e careca avançadas... vestindo excentricamente seu terno jeans, de um azul há muito desbotado... desfilava por entre as Repartições como um general em revista à tropa...

Se o homem dizia que era greve, era greve mesmo... e quem se aventurasse a furar, que agendasse de uma vez o martelinho de ouro e o borracheiro pois as retaliações eram sérias... impunidade não existia para aquele homem... Foi amado por muitos, e temido pela maioria...

Reelegeu-se por mais 3 mandados e durante todos esses anos à frente do sindicato havia logrado conquistas homéricas: durante a Era M. o vencimento dos servidores mais que dobraram... bônus e gratificações brotavam pelas folhas de pagamento... relógios de ponto desapareciam misteriosamente... mulheres bonitas davam as caras nas festas de fim de ano... e até o café era mais gostoso.

Certa feita uma juíza recém- empossada acertou em cheio um tapa na cara do porteiro que lhe tentava impedir de adentrar o Tribunal com seu poodle...

E isso chegou aos ouvidos do Sr. M.

No dia seguinte o cachorro foi encontrado morto... largado nos degraus da escada de incêndio... tinha sofrido uma intoxicação alimentar combinada com uma diarréia aguda.

Amargando a morte do animal, a juíza deixou-se abater por um quadro de depressão profunda da qual nunca chegou a sair... acabou sendo aposentada por invalidez.

Aqueles tempos eram outros... sentíamos que éramos parte de algo maior e mais belo do que a Repartição... Éramos respeitados e temidos... não ríamos de piadinhas de juiz... vivíamos a alegria da ditadura maltrapilha e de baixo escalão... a burocracia-proletária estava no poder.

Hoje os burocratas andam cabisbaixos pelos corredores e pelas Repartições... tremem ao ver a figura do juiz... são extorquidos por flanelinhas das imediações e destratados por advogados... aquela placa com os dizeres "é crime desacatar funcionário público no exercício de sua função" não ostenta mais o brilho de antigamente, e já não se encontra nos balcões de atendimento...

Vivemos tempos sombrios desde que o Sr. M se foi...

O Sindicato hoje é uma piada de mau gosto.

Suga as contribuições sindicais e fretam um ônibus para um excursão farofenta a alguma cachoeira das redondezas durante o feriado emendado... promove festas de fim de ano horrorosas, frequentadas por pessoas igualmente horrorosas, numa churrascaria qualquer....

O velhote nos abandonou, aposentou-se e mudou para o sul de Minas com a esposa... Envelhece cada dia imerso numa terma mineral diferente, de onde sai todo enrugado ao cair da noite... Sentiria ele falta dos tempos em que reinava absoluto pelas Repartições?

E nós aqui também envelhecemos...

O que precisamos é de uma ideologia que nos faça rejuvenescer... fazer barulho... criar tumulto... lutar por qualquer coisa, por mais insana e absurda que possa parecer... assediar advogadas nos corredores... sair pelas ruas com um copinho de café na mão e um botom amarelo no peito:

"Aumento já!"

4 comentários:

  1. Assediar advogadas, sem dúvida, é um projeto de vida..

    ResponderExcluir
  2. Se o Balboa prefere assediar advogados, paciencia!! Viva as diferencas!!!!

    ResponderExcluir
  3. Abu:

    Aumento salarial? Ou aumento de atividades trabalhistas?

    ResponderExcluir
  4. Reiterando o que disse, para esclarecer qualquer mal entendido que parece ter surgido.. sim, acredito que assediar advogadAS é, de fato, um projeto de vida. não há ironia. afinal, para o que mais servem as advogadas?

    ResponderExcluir

 
BlogBlogs.Com.Br