sábado, 8 de agosto de 2009

Good morning champion!


Pela primeira vez, eu morgaria o expediente pela parte da manhã...

O que Ela reservava aos vagabundos que adentravam aquelas portas mofadas nas primeiras horas do dia? Dores nas costas? Telefonemas enganados? Garrafas de café vazias? Essas perguntas me assaltaram toda a noite de sono anterior...

Tanto foi assim que a letargia da minha condição ao acordar oscilava entre a de um zumbi tetraplégico e a de um vegetal onírico...

Foi nesse estado que cheguei lá... fui o primeiro a chegar... e com a ajuda de Deus e do relógio de ponto estragado seria o primeiro a sair...

Após tantos anos, a Repartição, agora pela manhã, poderia ainda me surpreender com alguma coisa? Dificilmente... pensei!

Ela era tão feia quanto a Repartição da tarde, a única diferença estava no sol, que batia mais ameno nos computadores e impressoras... e nos pardais igualmente feios, que lhe cantavam mais alto... só isso... ha... e ela inspirava mais preguiça também...

Não fazia cinco minutos que eu chegara e minha cabeça já se escondia entre os braços, e esses apoiavam-se na mesa... era preciso dormir... eu precisava muito dormir...

Foi esse o momento em que a porta se abriu...

Entrava um simpático homem vestindo camiseta branca, short sport preto... Demorei a conceber aquela imagem... o que era aquilo que ele arrastava ruidosamente? Por acaso este homem esta empurrando uma bicicleta pela Repartição? Não pode ser... talvez seja o sono me pregando peças...

Mas era isso mesmo... ele arrastava uma bicicleta, e dependurado no guidon dessa havia um saquinho de pão.

- Opa! Bom dia! - saudou ele energicamente enquanto passava por mim.

O homem pingava suor... deixara uma trilha molhada desde a porta até a cozinha...
Tão logo guardou a bicicleta, procedeu uma série de alongamentos no quintal. E depois veio entrando na Repartição novamente com uma toalhinha branca no ombro... saudou-me com um um simpático sorriso e trancou-se no banheiro...

O que está acontecendo? Quem era aquele homem? Um burocrata feliz? Como pode alguém ousar viver a rotina burocrática como se passeasse pelo clube? Quem ele pensa que é? Não se despreza os mofos mal ilumiados da Repartição dessa forma... Por acaso o Sr. R sabia que no turno da manhã havia pessoas como esse cara?

Do banheiro eu podia ouvir o chuveiro ligado... tamanha era sua ousadia que ele usava água fria... e isso às 7 da manhã...

A porta se abriu e ele me sai lá de dentro com uma camiseta de nylon, uma calça de tactel listrada, e um tênis branquíssimo... Não mais pingava suor, mas creme dos cabelos molhados... vinha andando e vaporando um shampoo de maça verde...

Aquele cheiro me enchia as narinas e misturava-se com o de outras frutas, que agora ele cortava habilidosamente enquanto preparava uma vitamina mista na cozinha.

Aquela postura saudável me incomodou, não nego... mas sua simpatia era contagiante. Convidou-me a tomar um copo de vitamina - que por sinal estava ótima- e passamos boa parte do dia no quintal... sob o sol da manhã... conversando coisas leves sobre aventuras, sports, alimentação, yoga e psicotrópicos supostamente inofensivos.

Quando cansamos do quintal, voltamos e espreguiçamo-nos nas cadeiras giratórias... dispus-me a fazer um café, mas para minha surpresa ele só bebia chá descafeinado...

- Cafeína não faz bem... e nem acredito que ainda hoje hajam pessoas que fumem - disse isso apontando para a mesa do Sr. R, completamente vazia, não fosse pelo maço de paiol que se exibia solitário.

Ele entrou na internet e me chamou para ver... eram lindas fotos de cachoeiras volumosas, montanhas verdejantes, pássaros, céis azuis... senti meus olhos incharem, quase lacrimejaram... talvez fossse sono - talvez estivesse comovido... não sei ao certo.

- Vou fazer essa trilha esse fim de semana... de bicicleta... bora? - convidou-me gentilmente.

Nesse momento o telefone frenético ao meu lado soou forte... eu me assustei; o homem saudável, nem se mexeu... seus olhos continuavam vidrados na tela... a Repartição não existia para ele...

Fim um movimeno desajeitado para tirar o telefone do gancho... o fio, como sempre, estava completamente enroscado, o que fez todo o aparelho vir junto caindo no chão... como eu odiava com isso acontecia! E era algo tão bem previsível, bem típico desses aparelhos plásticos vagabundos... que não se prendem à superfície e correm desorientados como um lápis numa mesa empenada...

Para evitar um desatre maior projetei o corpo todo para baixo, no intuito de pegar o telefone antes que ele se espatifasse no chão... a corcunda se repuxou... uma pinçada no ciático... e o prenúncio de uma taquicardia enervada...

O homem saudável continuava imerso nas montanhas.

- Então? Bora? -ele cobrava uma responta minha com os olhos na tela.

O telefone se equilibrava nas minhas mãos ainda trêmulas... olhei para o relógio... dentro de minutos o chefe chegaria... e depois os vagabundos da tarde... o tempo começava a esquentar... o sol da manhã não era mais ameno... e os pardais se amontoavam imundos no parapeito das janelas...

Olhei uma última vez para aquelas fotos e senti tristezas...
Aqueles mares de morros não me cabiam... e essas horas da manhã não são minhas...

- Fica para uma próxima...

...uma próxima encarnação- completei em pensamento.

8 comentários:

  1. -
    Céis?? Não seriam Seis? Hahahahaha.... :D

    Alê
    -

    ResponderExcluir
  2. Nossa...Termina e depois?!

    ResponderExcluir
  3. ôooo burrocrata..
    isso aqui virou de vez uma repartição pública.. jogada às traças...

    ResponderExcluir
  4. -
    É mesmo! Deviam privatizar esse blog...
    -

    ResponderExcluir
  5. Ilmos. Srs.

    Prefiro que vejam mesmo esse blog como uma repartição pública. Pois da mesma forma como ninguém alimenta expectativas em relação a essa não alimentarão também em relaçao a esses escritos mofados...

    Mas não é por indolência que às vezes deixo o blog "largado às traças".

    Permitam-me explicar-lhes por meio de uma breve anedota:

    "Lembro-me que certa vez, ao limpar minhas gavetas, encontrei um ofício ao que deveria ter respondido a mais de um ano. Aquilo me causaria espanto ao mais relapso burocrata. Por isso mesmo tratei de respondê-lo imediatamente.

    Semanas depois recebi do órgão que havia me enviado aquele ofício que eu respondera com mais de um ano de atraso uma carta... Abri-a com apreesão... esperando repreendimentos... tapas de luvas... xingamentos... ou coisas do tipo.

    Para minha surpresa eles me encaminhavam um outro ofício indagando sobre o assunto que eles mesmos haviam levantado no ofício anterior.

    Ou seja, tamanho foi o lapso entre o ofício deles e o minha resposta que a coisa toda caiu no esquecimento."

    Só contei essa singela e burocrática historinha para dizer que eu não quero que o mesmo aconteçao com o blog...

    Vocês eficientes leitores tem todo o direito de cobrar... e eu, burocrata relapso, tenho a obrigação de atender as demandas...

    ... com as protelações de estilo, é claro!

    Att.

    O Burrocrata

    ResponderExcluir
  6. -
    ISSO É UM ABSURDO!

    Quero falar com o responsável, I-ME-DI-A-TA-MEN-TE!!!!

    Aquele paletó ali é o dele?

    Alê
    -

    ResponderExcluir
  7. ta certo, burrocrata que é burrocrata.. Faz tudo nas cochas mesmo.
    Se não quer.. Não o faça!!!hehe

    ResponderExcluir
  8. estou me sentindo lesado...

    ResponderExcluir

 
BlogBlogs.Com.Br