tag:blogger.com,1999:blog-34014449649160315152024-03-13T22:35:29.908-07:00O BurrocrataO Burrocratahttp://www.blogger.com/profile/07882809071894507284noreply@blogger.comBlogger33125tag:blogger.com,1999:blog-3401444964916031515.post-13841338992518387822010-05-07T17:08:00.000-07:002010-05-08T00:18:46.169-07:00Um cadáver, um cristal<a href="http://1.bp.blogspot.com/_7FVwkIKrvVs/S-UPokJ__KI/AAAAAAAAAJQ/zCgooeE1QAs/s1600/fada2.jpg"><img style="MARGIN: 0px 10px 10px 0px; WIDTH: 124px; FLOAT: left; HEIGHT: 200px; CURSOR: hand" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5468794512086138018" border="0" alt="" src="http://1.bp.blogspot.com/_7FVwkIKrvVs/S-UPokJ__KI/AAAAAAAAAJQ/zCgooeE1QAs/s200/fada2.jpg" /></a><br /><div><a href="http://4.bp.blogspot.com/_7FVwkIKrvVs/S-UJtex305I/AAAAAAAAAJI/ZVn_F5KLwyI/s1600/fada2.jpg"></a><div><br /><div><div>O<em> cadáver no título não é o do Velho</em>... </div><div></div><br /><div>O que ora jaz inerte não é o "difunto" do nosso elegante herói em mocassins ... do nosso tirano das casimiras desabotoadas... do nosso eremita dos pégasos alados... </div><br /><div></div><div>O Sr. R ainda está vivo... debilitado e agonizante... porém vivo e recebendo pelos cofres do Estado...Inutilmente, sua mesa aguarda, vazia e triste, o dia de seu retorno... Mas sabemos todos que ele não volta mais a visitar os expedientes. Pelo menos não nessa encarnação!</div><br /><div></div><div>Ainda assim, menos por pudores de discrição do que por lealdade ao testamento do velho, não abri aquela gaveta... a chave que me foi confiada aguarda ansiosa o dia choroso em que aquele corpo raquítico descer, a toque de caixa, os sete palmos que o esperam... </div><div></div><br /><div>Tenho em mim a firme convicção de a tácita e derradeira vontade do Sr. R ao me confiar as chaves é que seja aguardado o dia de sua desencarnação para a abertura da famigerada gaveta.</div><br /><div></div><div>Em sonhos, contorço-me em sentimentos confusos, vislumbrando por uma gretinha os terrores cósmicos ou os júbilos celestiais que aquela humilde chavinha de plástico pode libertar: uma prova de um imenso esquemas de corrupção envolvendo figurões engravatados... uma jóia anciã pertencente a dinastias remotas extraviada em meio aos fungos da Repartição... perversões sexuais de um tarado mental... entorpecentes à espreita...</div><br /><div></div><div></div><div></div><br /><div>Por aqui tudo é possivel... </div><br /><div></div><br /><div></div><div></div><div></div><div>Nas intermitências da rotina, a Repartição, engenhosa e dissimulada, aguarda pacientemente a hora e a vez pregar o horror na testa do mais destemido, acalentado e indolente burocrata, fazendo-o encolher arripiado por debaixo de uma mesa em courvim e desabar a chorar feito criança espantada. </div><br /><div></div><div>Por aqui nada é impossível... Afinal, como rezou um poeta, toda porta é viagem... </div><div></div><br /><div>E mesmo sabendo que, em meio ao tédio e à indolência do expediente, infinitas possibilidades nos aguardam, na maioria das vezes não estamos preparados para lidar com o que nos deparamos... </div><br /><div></div><div>Senão vejamos...</div><br /><div></div><div>Às sextas-feiras pela tarde, é comum os servidores confiarem ao boy, paladino do lanche, o nobre desígno de comprar um pacote de pão e uma coca super-litro... Daí todos comem festivamente sob o signo do fim de semana... Desse lanche restam sobras....que atravessam o sábado... que atravessam o domingo... e que ao final desse ciclo se encontram segunda-feira sobre a pia da cozinha à mercê dos vagabundos que não costumam desfrutar o café da manhã em casa. </div><br /><div></div><div></div><div></div><div>Pão murcho... coca quente... e o café gelado... a essa soma azeda chamam "o morto"!</div><div></div><div></div><div></div><div></div><br /><div>Uma das primeiras coisas que se escuta pela manhã das segundas-feiras é uma voz sonolenta rondando a cozinha: "<em>vou comer o morto</em>!" E é justamente isso o que se espera ver ao abrir a porta da cozinha nessas horas: um infeliz estilo zumbi comendo pão murcho com café gelado. </div><br /><div></div><div></div><div>No entanto, como eu disse anteriormente, a porta da cozinha me reservara outra viagem naquela manhã de segunda...</div><br /><div></div><div>Abri-a e estava tudo escuro... as persianas da janela, para meu espanto encontravam-se fechadas... Foi com dificuldade que minha visão, ainda turva e remelenta de sono, se adaptou àquela escuridão... O breu seria completo se não fossem as luzes que escapavam para dentro através das gretas da persiana... Meu primeiro impulso foi abrir a janela... mas antes que eu o fizesse... deti-me com um vulto à minha frente... </div><div></div><br /><div>Pelos volumes do corpo não hesitei: era a Sra. V... </div><div></div><br /><div>A gorda enfileirara 4 cadeiras e sem pudor algum deitou, de barrigão para cima, seus 120 quilos sobre a maca improvisada... Ou ela não sentira minha presença, ou me ignorara deliberadamente, pois mantinha os olhos cerrados... </div><div></div><br /><div>A cena remetia a um velório: um enterro de um cadáver gordo estirado sobre um caixão... </div><div></div><br /><div>Mas o que signifava aquele despropósito afinal? A Sra. V de olhos fechados... tranquila... estirada sobre as cadeiras... os braçinhos roliços cruzados sobre o peito... </div><div></div><br /><div>Só a pude entender quando, acostumado à escuridão do cômodo, vislumbrei a chave para esse enigma: um cristal jazia sobre a barriga flácida da Sra. V.... uma singela pedra envolta naquele pântano gelatinoso...</div><div></div><br /><div>Tratava-se de mais uma bizarrice no extenso rol de esoterismos da Sra. V: <em>Cromoterapia... Anjos Cabalísticos... Reike... I Ching... Paulo Coelho... Numerologia Astal... Cavaleiros Templários</em>... </div><div></div><br /><div>E agora, algo realmente mágico e trancedental: </div><div></div><br /><div><em>A técnica ancestral do cristal na barriga!</em> </div><div></div><br /><div>Ao sair fiz questão de bater forte aquela porta atrás de mim... Minha esperança é que aquele baque surdo pudesse fazer a vagabunda acordar para a vida...</div><div></div><br /><div>Mas como disse o poeta, cada porta é uma viagem, certo? Pois então, se for esse mesmo o caso só nos resta ser tolerantes para com os outros...</div><div></div><br /><div>Passei pela mesa da Sra. V e não pude deixar de notar, com uma ponta de enervamento, na nova aquisição para sua biblioteca esotérica: "<em>Alegria: o segredo da beleza</em>"...</div><div></div><br /><div>Fiz muita força para me lembrar do ensinamento do poeta... Mas aqui na Repartição não somos poetas... tampouco inclinados à tolerância... o sentimento que dá o tom dos expedientes é a frustração... e a ela todos acabamos sucumbindo...</div><div></div><br /><div>-"<em>Alegria: o segredo da beleza" -</em> uma pinóia!</div><div></div><br /><div><em>Ela é triste... e feia por completo</em>! - destilei baixinho e envergonhado comigo mesmo essa agressão gratuita àquela simpática fada gorda!</div><div></div><br /><div>Ela não merecia isso.. Ela é uma pessoa boa! </div><div></div><div></div><br /><div></div><div></div><div>Ela merecia ser magra... bonita... e feliz! </div><div></div><div></div><br /><div></div><div>Quem sabe um dia não apareça alguém por aqui que saiba dar o devido valor à aura mágica dessa mulher? </div><div></div><div></div><div></div><br /><div>Aí ela se revestiria em luzes astrais... e sairia voando pela janela como um vaga-lume inchado...para nunca mais voltar.</div></div></div></div>O Burrocratahttp://www.blogger.com/profile/07882809071894507284noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-3401444964916031515.post-88010900814178021122010-01-30T20:01:00.000-08:002010-02-23T21:35:49.918-08:00O pégaso do peito de aço<a href="http://1.bp.blogspot.com/_7FVwkIKrvVs/S4S5vxuT5QI/AAAAAAAAAIw/DjOdWIglxmA/s1600-h/small.jpg"><img style="MARGIN: 0px 10px 10px 0px; WIDTH: 200px; FLOAT: left; HEIGHT: 200px; CURSOR: hand" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5441678480222971138" border="0" alt="" src="http://1.bp.blogspot.com/_7FVwkIKrvVs/S4S5vxuT5QI/AAAAAAAAAIw/DjOdWIglxmA/s200/small.jpg" /></a><br /><div>Depois de alguns meses de férias chega minha hora de voltar à Repartição!</div><br /><div></div><div></div><div></div><div>Fato é que essas férias foram um hiato absoluto em minha vida burocrática... Para mim era como se a Repartição nunca houvesse existido... e tenho certeza que para a Repartição a recíproca era verdadeira.</div><br /><div></div><div>Devo, no entanto, confessar, que o longo afastamento da rotina burocrática não me fizera bem... </div><br /><div></div><div>É que um burocrata apartado da Repartição, de seus carimbos, de seu café, de sua mesa vazia, perde seu referencial...<br /></div><div></div><br /><div>A condição vagabunda nos atrela de tal forma que, quando não estamos exercendo de forma plena nossa inutilidade padecemos de uma angustiante crise existencial. </div><br /><div></div><div>Foi então que entre ser inútil em casa e ser vagabundo na Repartição decidi, com o coração dilacerado, regressar a meu lugar de direito... </div><div></div><br /><div>Eu havia acordado naquele dia com uma vontade louca de bater mil carimbos... de grampear um maço de cinquenta folhas em um golpe só... e quem sabe até redigir um elegante ofício para algum lugar... Calcei, então, meus velhos mocassins, vesti minha blusa de casimira, soquei-a em um movimento brusco para dentro das calças e apressado tomei o rumo da Repartição... </div><br /><div></div><div>Não poderia continuar vivendo fingindo não ser o que eu era: <em>um burocrata, um burocrata</em>! - Assim segui exclamando orgulhoso.</div><div></div><div></div><div></div><br /><div>Para mim hoje seria apenas um aquecimento para a volta à rotina... a tarde seria calma, lenta e vagarosa... eu tomaria café cordialmente com os velhos vagabundos, perguntaria pela saúde da família de todos e voltaria para casa... </div><br /><div></div><div>Mas eu estava enganado... </div><div></div><br /><div>Ao abrir a porta me deparei com a Repartição empolvorosa... os desocupados todos de pé... alvoraçados... enrigeciam as peles flácidas em risadas perversas... um escarcéu completo! </div><div></div><br /><div>Que zombarias teriam o poder de sublevar esses vegetais, tirando-os da inércia de suas mesas e lançando-os naquele vórtice alucinado de deboche?</div><br /><div></div><div>A resposta veio com a Sr. V, a fofoqueira, lerda e indolente... Tão logo a pachola me viu veio arrastando suas varizes e o seu blusão colorido e esvoaçante em minha direção... apertou os olhinhos maldosos nas gorduras da face e soltou a linguinha venenosa:</div><br /><div></div><div>- <em>O Sr R... o Sr. R...</em></div><div></div><br /><div>O que teria feito o velho agora? - pensei já me desmanchando de rir por antecipação... Que bela homenagem! Logo no dia de minha volta à burocracia o velhote me presenteara com uma das suas... teria ele humilhado o chefe mais uma vez? distribuído tapa de luvas ao juiz? ameaçado advogados?</div><br /><div></div><div>Mais uma vez eu estava enganado... </div><div></div><br /><div>A lerda teceu a estória completa... Ela disse que constatara hoje na pele do Sr. R aquilo que nunca nenhum de nós em todos esses anos de burocrática convivência jamais pôde conceber... nem mesmo em nossos sonhos mais selvagens... </div><br /><div></div><div>É que, de acordo com a fofoqueira, quando o Sr. R fumava distraído no quintal, um vento entrou pelo colarinho levantando sua blusa meio desabotoada, fazendo o sol fez refletir a imagem estampada em seu peito: <em>um pégaso prateado!</em></div><div></div><div> </div><div>Não pude acreditar... Então o velhote ostentava um pégaso prateado tatuado no peito?!</div><div></div><br /><div>Mas justo o Sr. R? Por quê? O Sr. R. , último exemplar da velha guarda da burocracia vagabunda... seu silêncio, seu niilismo, sua completa falta de respeito por qualquer forma de autoridade... sua sobriedade nas horas mais críticas... seu fino desprezo pela inapetência mental dos companheiros... sua elegância...</div><div></div><br /><div>E agora um pégaso prateado tatuado no peito ameaçando sua reputação! </div><div></div><br /><div>Mas afinal o que representa uma chaga desbotada no peito diante do espírito desse homem? A carne é fraca e tatuada; mas o espírito é forte e sem máculas... isso é o que importa no fim das contas... não é?!</div><div></div><br /><div>Se ao menos o velho estivesse presente para se defender...</div><br /><div></div><div>O deboche esmoreceu até dar lugar ao silêncio e à melancolia usual. A luz da tarde já despontava pelas janelas... e eu seguia alucinado enxergando o pégaso prateado pairando sobre as mesas, os computadores, as impressoras, as almofadas de carimbo. </div><br /><div></div><div>Onde estaria o Sr. R? Saberia ele dos ataques covardes que ocorriam durante sua ausência? Daria ele alguma importância ao episódio? Como teria contraído aquele pégaso?</div><div></div><br /><div>A resposta veio à minha mesa às 17:50hs na forma do ofício nº 00. 348.661-0, esse número e seu contéudo me assombraria pelo resto dos meus dias...</div><div></div><br /><div>Pelo ofício deixado na minha mesa por algum boy, pasmei ao tomar conhecimento da verdadeira estória... Tratava-se de um comunicado para dar ciência ao chefe da Repartição que o Sr. R estava a partir de então afastado por tempo indeterminado por motivos de saúde... </div><div></div><br /><div>Mesmo repleto de eufemismos técnicos o ofício não escondia o tom melancólico ao falar da condição do nosso herói desenganado... Pela leitura, deprendia-se que o coração do velhote já padecia há algum tempo de uma dessas patologias degenerativas...</div><div></div><br /><div>Um frio correu minha espinha... Enfim, consegui entender como os olhos apertados na cara gorda da Sra. V e sua ignorância puderam induzi0la em erro... </div><br /><div></div><div>O que refletiu sob o sol não era nenhum pégaso prateado... Era na verdade o marcapasso que o Sr. R delicadamente escondia por debaixo das vestes... O nobre coração do nosso Sr. R estava condenado e a engenhoca de aço acoplada a seu peito lhe dava as forças para suportar o marasmo e o tédio da Repartição nos seus últimos dias... </div><br /><div>Pobre Sr. R...</div><div></div><br /><div>Aquilo tudo era loucura... As batidas do coração do Sr. R estavam contadas e o homem, por algum motivo, o velho fazia questão de passar seus últimos momentos por entre essas paredes mofadas... O que esperava ele da Repartição afinal? </div><div></div><br /><div>Isso eu nunca soube... </div><div></div><br /><div>Guardei em segredo, com o chefe, a explicação do pégaso prateado. </div><div></div><br /><div>Enquanto o Sr. R gozava sua licença para morrer, os vagabundos macaqueavam... volta e outra riam do pégaso de prata no peito do Sr. R... Especulavam se fora o velhote um marinheiro renegado... um ex-dentento... ou o primeiro surfista brasileiro... </div><div></div><br /><div>Puta mundo injusto esse!</div><div></div><br /><div>Constrói-se uma vida ilibada para um dia um ventinho cretino e uma gorda leviana trazer tudo abaixo... </div><div></div><br /><div>O que o Sr. R achava disso? </div><div></div><br /><div>Certo é que sua estória não pode acabar assim... Um vento... um pégaso... uma doença cardíaca... e adeus Sr. R? Não... não poderia ser esse o fim.</div><br /><div></div><div>Eu tornaria a ver velho mais uma vez. </div><br /><div></div><div>Nessa última ocasião, o Sr. R se estendeu comigo durante um copo de café... Cinco minutos de café: nada menos nada mais... foi sem dúvidas nosso contato mais extenso durante todos esses anos de burocracia...</div><br /><div></div><div>Eu estava só na Repartição... Ele veio com uma tarde fria... Estava já bastante debilitado... Andava passos curtinhos rumo à cozinha.</div><div></div><br /><div><em>Venha cá rapaz</em>!- sua voz quase sumida, mas a autoridade continuava lá.</div><div></div><br /><div>Com dificuldades, me serviu um copo de café e, como estava completamente encurvado, disse sem me fitar os olhos :</div><div></div><br /><div>-<em>Vou sumir por uns tempos... quero que você assuma minha mesa... aqui está a chave da gaveta... você saberá o que fazer com o que lá encontrar... confio a você esse segredo!</em></div><br /><div><em></em></div><div>Estremeci... Antes que eu pudesse dizer qualquer coisa ele foi logo saindo... estilo mestre dos magos... abriu a porta com dificuldade e sumiu pelas escadas... </div><br /><div></div><div>Cheguei a tempo na janela para ver seu palio cinza sair do estacionamento... O carro não deslizava macio como antes... O Sr. R. sentava no lado dos passageiros e um homem de branco guiava o carro aos solavancos pelas ruas.</div><br /><div></div><div>Olhei a fumaçada preta que saía do escapamento subir alto até se perder em meio às nuvens carregadas</div><div></div><br /><div>Vá em paz Sr. R, pégaso do peito de aço!</div>O Burrocratahttp://www.blogger.com/profile/07882809071894507284noreply@blogger.com7tag:blogger.com,1999:blog-3401444964916031515.post-88950256225277797452009-08-08T16:30:00.000-07:002009-08-10T20:42:28.449-07:00Good morning champion!<a href="http://2.bp.blogspot.com/_7FVwkIKrvVs/Sn4mw0MKYnI/AAAAAAAAAIo/BBA-r6pikzI/s1600-h/back.gif"><img id="BLOGGER_PHOTO_ID_5367770425957442162" style="FLOAT: left; MARGIN: 0px 10px 10px 0px; WIDTH: 164px; CURSOR: hand; HEIGHT: 200px" alt="" src="http://2.bp.blogspot.com/_7FVwkIKrvVs/Sn4mw0MKYnI/AAAAAAAAAIo/BBA-r6pikzI/s200/back.gif" border="0" /></a><br /><div>Pela primeira vez, eu morgaria o expediente pela parte da manhã...</div><div></div><br /><div>O que Ela reservava aos vagabundos que adentravam aquelas portas mofadas nas primeiras horas do dia? Dores nas costas? Telefonemas enganados? Garrafas de café vazias? Essas perguntas me assaltaram toda a noite de sono anterior... </div><div></div><br /><div>Tanto foi assim que a letargia da minha condição ao acordar oscilava entre a de um zumbi tetraplégico e a de um vegetal onírico...</div><br /><div></div><div>Foi nesse estado que cheguei lá... fui o primeiro a chegar... e com a ajuda de Deus e do relógio de ponto estragado seria o primeiro a sair...</div><div></div><br /><div>Após tantos anos, a Repartição, agora pela manhã, poderia ainda me surpreender com alguma coisa? Dificilmente... pensei!</div><div></div><br /><div>Ela era tão feia quanto a Repartição da tarde, a única diferença estava no sol, que batia mais ameno nos computadores e impressoras... e nos pardais igualmente feios, que lhe cantavam mais alto... só isso... ha... e ela inspirava mais preguiça também...</div><div></div><br /><div>Não fazia cinco minutos que eu chegara e minha cabeça já se escondia entre os braços, e esses apoiavam-se na mesa... era preciso dormir... eu precisava muito dormir...</div><div></div><br /><div>Foi esse o momento em que a porta se abriu...</div><div></div><br /><div>Entrava um simpático homem vestindo camiseta branca, short sport preto... Demorei a conceber aquela imagem... o que era aquilo que ele arrastava ruidosamente? Por acaso este homem esta empurrando uma bicicleta pela Repartição? Não pode ser... talvez seja o sono me pregando peças...</div><div></div><br /><div>Mas era isso mesmo... ele arrastava uma bicicleta, e dependurado no guidon dessa havia um saquinho de pão.</div><br /><div></div><div>- <em>Opa! Bom dia!</em> - saudou ele energicamente enquanto passava por mim.</div><br /><div></div><div>O homem pingava suor... deixara uma trilha molhada desde a porta até a cozinha... </div><div> </div><div>Tão logo guardou a bicicleta, procedeu uma série de alongamentos no quintal. E depois veio entrando na Repartição novamente com uma toalhinha branca no ombro... saudou-me com um um simpático sorriso e trancou-se no banheiro...</div><div></div><br /><div>O que está acontecendo? Quem era aquele homem? Um burocrata feliz? Como pode alguém ousar viver a rotina burocrática como se passeasse pelo clube? Quem ele pensa que é? Não se despreza os mofos mal ilumiados da Repartição dessa forma... Por acaso o Sr. R sabia que no turno da manhã havia pessoas como esse cara?</div><br /><div></div><div>Do banheiro eu podia ouvir o chuveiro ligado... tamanha era sua ousadia que ele usava água fria... e isso às 7 da manhã... </div><div></div><br /><div>A porta se abriu e ele me sai lá de dentro com uma camiseta de nylon, uma calça de tactel listrada, e um tênis branquíssimo... Não mais pingava suor, mas creme dos cabelos molhados... vinha andando e vaporando um shampoo de maça verde...</div><div></div><br /><div>Aquele cheiro me enchia as narinas e misturava-se com o de outras frutas, que agora ele cortava habilidosamente enquanto preparava uma vitamina mista na cozinha.</div><div></div><br /><div>Aquela postura saudável me incomodou, não nego... mas sua simpatia era contagiante. Convidou-me a tomar um copo de vitamina - que por sinal estava ótima- e passamos boa parte do dia no quintal... sob o sol da manhã... conversando coisas leves sobre aventuras, sports, alimentação, yoga e psicotrópicos supostamente inofensivos.</div><div></div><br /><div>Quando cansamos do quintal, voltamos e espreguiçamo-nos nas cadeiras giratórias... dispus-me a fazer um café, mas para minha surpresa ele só bebia chá descafeinado... </div><div></div><br /><div><em>- Cafeína não faz bem... e nem acredito que ainda hoje hajam pessoas que fumem</em> - disse isso apontando para a mesa do Sr. R, completamente vazia, não fosse pelo maço de paiol que se exibia solitário.</div><div></div><br /><div>Ele entrou na internet e me chamou para ver... eram lindas fotos de cachoeiras volumosas, montanhas verdejantes, pássaros, céis azuis... senti meus olhos incharem, quase lacrimejaram... talvez fossse sono - talvez estivesse comovido... não sei ao certo.</div><div></div><br /><div><em>- Vou fazer essa trilha esse fim de semana... de bicicleta... bora?</em> - convidou-me gentilmente.</div><div></div><br /><div>Nesse momento o telefone frenético ao meu lado soou forte... eu me assustei; o homem saudável, nem se mexeu... seus olhos continuavam vidrados na tela... a Repartição não existia para ele...</div><br /><div></div><div>Fim um movimeno desajeitado para tirar o telefone do gancho... o fio, como sempre, estava completamente enroscado, o que fez todo o aparelho vir junto caindo no chão... como eu odiava com isso acontecia! E era algo tão bem previsível, bem típico desses aparelhos plásticos vagabundos... que não se prendem à superfície e correm desorientados como um lápis numa mesa empenada... </div><div></div><br /><div>Para evitar um desatre maior projetei o corpo todo para baixo, no intuito de pegar o telefone antes que ele se espatifasse no chão... a corcunda se repuxou... uma pinçada no ciático... e o prenúncio de uma taquicardia enervada...</div><div></div><br /><div>O homem saudável continuava imerso nas montanhas.</div><div></div><br /><div>- <em>Então? Bora?</em> -ele cobrava uma responta minha com os olhos na tela.</div><div></div><br /><div>O telefone se equilibrava nas minhas mãos ainda trêmulas... olhei para o relógio... dentro de minutos o chefe chegaria... e depois os vagabundos da tarde... o tempo começava a esquentar... o sol da manhã não era mais ameno... e os pardais se amontoavam imundos no parapeito das janelas...</div><br /><div></div><div>Olhei uma última vez para aquelas fotos e senti tristezas... </div><div> </div><div>Aqueles mares de morros não me cabiam... e essas horas da manhã não são minhas...</div><br /><div></div><div>-<em> Fica para uma próxima...</em> </div><div></div><br /><div>...uma próxima encarnação- completei em pensamento.</div>O Burrocratahttp://www.blogger.com/profile/07882809071894507284noreply@blogger.com8tag:blogger.com,1999:blog-3401444964916031515.post-35351410316139017622009-07-26T08:34:00.000-07:002009-07-29T23:13:46.755-07:00O teatro de sombras<a href="http://2.bp.blogspot.com/_7FVwkIKrvVs/SmyZOUYmmkI/AAAAAAAAAIg/ucOLurhrzbM/s1600-h/capuz1.jpg"><img style="MARGIN: 0px 10px 10px 0px; WIDTH: 148px; FLOAT: left; HEIGHT: 200px; CURSOR: hand" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5362829727560538690" border="0" alt="" src="http://2.bp.blogspot.com/_7FVwkIKrvVs/SmyZOUYmmkI/AAAAAAAAAIg/ucOLurhrzbM/s200/capuz1.jpg" /></a><br /><div>O chefe havia reunido os vagabundos em torno de uma ociosa mesa para exercitar um pouco da fala difícil... de tempos em tempos ele tinha essa necessidade de confessar a esmo um vocabulário rebuscado e fora de contexto...</div><br /><div></div><div>Era menos uma reunião do que uma tragédia encenada... um monólogo triste retratando os esforços de um rábula em sua agonia na luta homérica contra as palavras... </div><div></div><br /><div>O tema em pauta não importava... Aliás, nem mesmo havia um tema... Do que poderíamos esperar que ele falasse? Dos novos critérios quantitativos a serem observados nos procedimentos de refill das almofadas de carimbo? Da proposição de novas diretrizes para a reforma dos cabeçalhos dos formulários de ofício? Da abertura de inquérito administrativos para investigar o culpado pelo não fechamento da garrafa de café no dia anterior? </div><br /><div></div><div>Mesmo cientes da completa perda de tempo que aquilo tudo representava, éramos todos solidários com aquele homem... Afinal, tínhamos todo o tempo do mundo para perder... Tempo livre era o que não faltava... </div><br /><div></div><div>Ademais, havia ali um acordo muito sutil... Deixávamos o homem encarnar uma mistura de Roberto Justus com Rui Barbosa por alguns instantes durante o mês; e ele não nos pertubaria com trabalhos inventados... </div><br /><div></div><div>Franzíamos as sombrancelhas... apoiávamos levemente cotovelo na mesa e o rosto no indicador e polegar... inclinávamos o corpo para frente... e deixávamos ele devagar sobre procedimentos, portarias, protocolos... Enfim, tudo aquilo que em geral era passível de imprimir novas dificuldades a coisas simples e corriqueiras.... </div><div></div><br /><div>Não raro eram as vezes em que, durante essas reuniões encenadas, improvisávamos nosso papel de maneria mais ativa e esforçada... Quando percebíamos que ele se travara nas armadilhas de uma contrução sintáxica ardilosa por ele próprio concebida, intervínhamos para livrá-lo do constrangimento... </div><br /><div></div><div>Lembro-me de que certa vez após discorrer sofregamente acerca de uma nova Lei que absolutamente nenhum efeito prático implicava para o funcionamento da Repartição; o chefe abrira pela primeira vez espaço para a intervenção de seus interlocutores vagabundos:</div><div></div><br /><div>"<em>Tendo em vista considerar encerrada a exposição de motivos dessa nova Lei, ora passo a palavra à mesa... para fins de comentários acerca do tema em tela</em>".</div><br /><div></div><div>Todos entreolharam-se com surpresos... Ninguém esperava por essa... Não justamente agora que já adentrávamos o sagrado horário de almoço... Teria ele sentido que estávamos com nossas mentes a anos-luz de distância daquela Repartição durante sua fala? Teria ele o intuito de nos castigar por não estarmos fingindo atenção com o devido afinco?</div><div></div><br /><div>Fato é que tudo indicava que, até o momento, aquela reunião não saciara sua perversão pelas palavras difíceis... Então ele foi além: </div><div></div><br /><div><em>"Temos ainda alguns minutos para a inclusão de uma outra pauta... sugestões?"</em></div><br /><div></div><div>Houve um silêncio mórbido e acanhado... Era um silêncio tirâncio que emanava do chefe e espalhava-se em todas as direções... dominando a mesa inteira, salvo a minha extrema direita... </div><br /><div></div><div>É que de lá rugia uma cadeira giratória que desde o começo da reunião vinha sendo tranquilamente e discretamente embalada de uma lado para o outro... </div><div></div><br /><div>Sentado ereto nessa cadeira... com o semblante sereno... os dois cutuvelos descansando simetricamente no apoio de braços... os dedos entrelaçado à frente do peito... lá estava o único homem capaz de nos redimir: o Sr. R</div><br /><div></div><div>Ele parecia saber que contávamos com ele para evitar que fossemos privados do horário de almoço, sendo submetidos a mais meia hora de desnecessariedades... </div><div></div><br /><div>E nós tínhamos certeza que aquele homem não nos decepcionaria.</div><div></div><br /><div>Sua voz ressoou clara, densa, e elegante- todos atributos que o léxico jurídico capenga do chefe não tinha.</div><div></div><br /><div><em>"O que vamos fazer com aquela caixa de marimbondos na sala de arquivo?"-</em> inquiriu o Sr. R</div><div></div><br /><div>Meu corpo estremeceu... os músculos do abdomem se contraíram a ponto de eu conseguir conter o riso... mas não pude deixar que escapasse um ruído gutural e que um sorriso torto se instalasse no meu rosto...</div><div></div><br /><div>"<em>Bem... eu... eu... não creio que esse assunto seja adequado a esse foro</em>"- gaguejando, o chefe replicou.</div><br /><div></div><div><em>"Ótimo, podemos todos almoçar então"</em> -disse o Sr. R, e foi logo se levantando.</div><br /><div></div><div>Todos fizeram o mesmo em seguida... </div><br /><div></div><div>O chefe não teve como reagir... ele ficou pasmo... colhendo papéis sobre a mesa... naquele momento até mesmo as palavras mais simples e singelas lhe fugiam... era o preço que agora pagava pelo desprezo cultivado por elas...</div><br /><div></div><div>O Sr R. saía em direção à porta. </div><div></div><br /><div>Alcancei-o... bati às suas costas e perguntei respeitosamente onde ele iria almoçar.</div><div></div><br /><div>"<em>Em casa</em>"- respondeu secamente, e continuou caminhando tranquilo.</div><div></div><br /><div>Eu o observava parado à porta... Antes de entrar no carro, tirou um cigarro de palha do bolso da camisa surrada, acendeu-o com uma longa baforada e colocou os óculos escuros... os poucos cabelos brancos que ainda tinha desgrenhavam-se ao vento... <div></div><br /></div><div>"<em>Faz um café para a gente tomar quando eu voltar</em>"- gritou sem olhar para mim antes de arrancar no palio cinza.</div><br /><div></div><div>Eu então corri para a cozinha e fiz o café mais forte que alguém poderia conceber... gastei praticamento o pó de um pacote interio... e aguardei o Sr. R até o fim do expediente... mesmo sabendo que as chances dele voltar naquela tarde para a Repartição eram mínimas.</div>O Burrocratahttp://www.blogger.com/profile/07882809071894507284noreply@blogger.com3tag:blogger.com,1999:blog-3401444964916031515.post-22394702750661134042009-06-27T18:13:00.000-07:002009-07-05T00:28:46.400-07:00Sonhos gordos de inverno<a href="http://4.bp.blogspot.com/_7FVwkIKrvVs/SlBU3uPvR-I/AAAAAAAAAIY/5CLrggmpJEw/s1600-h/untitled.bmp"><img id="BLOGGER_PHOTO_ID_5354873273227102178" style="FLOAT: left; MARGIN: 0px 10px 10px 0px; WIDTH: 142px; CURSOR: hand; HEIGHT: 200px" alt="" src="http://4.bp.blogspot.com/_7FVwkIKrvVs/SlBU3uPvR-I/AAAAAAAAAIY/5CLrggmpJEw/s200/untitled.bmp" border="0" /></a><br /><div>O inverno na Repartição é época dos sonhos acordados.</div><br /><div></div><div>As friagens desses dias trazem tremores às pernas e bambezas indolentes aos pensamentos.</div><div></div><br /><div>O melhor que se pode fazer nessas horas mortas é arrastar uma cadeira para perto da janela e aproveitar uns parcos raios de sol enquanto se olha o movimento lá fora... </div><div></div><br /><div>E foi justamente o que eu fiz... </div><br /><div></div><div>Acontece que cada janela tem um dono... (<em>a melhor sem dúvidas é a janela da mesa que recentemente foi apropriada pelo Sr. R</em>)... e a minha é de todas a que tem pior vista: o porteiro e uma parede descascada era tudo o que eu via lá de fora.</div><br /><div></div><div></div><div>A porra daquele porteiro era tudo o que eu tinha para me distrair!</div><br /><div></div><div>O porteiro fofocando pela centésima vez a mesma piada indecente... o porteiro secando a mesma ninfeta que passava lá pelas duas da tarde... o porteiro contando vantagens para o flanelinha... o porteiro tomando café... o porteiro posando de xerife para uma velha que lhe pedia uma informação.</div><br /><div></div><div>Estava cansado daquele homem.</div><br /><div></div><div>E por isso eu olhava o céu</div><div></div><br /><div>Havia muitas nuvens bonitas... era relaxante vê-las dançar graciosas ao som das impressoras a laser... Uma nuvem em particular me chamou a atenção e serviu de mote para essas lembranças que agora passo a relatar.</div><div></div><br /><div>Aquele cúmulo pesado, cinzento e gordo que se arrastava lentamente fazia lembrar os contornos monstruosos da Sra. L... a gorda louca do Setor de Recursos Humanos.</div><div></div><div></div><div>Foi numa desvairada tarde de segunda-feira que a vi pela primeira e única vez. Tamanho trauma e desgaste me causara o episódio que desde aquele dia rezo sempre para que nunca mais eu torne a participar de semelhante absurdo... daquele despropósito... daquela insensatez espalhafatosa patrocinada pela Sra. L.</div><div></div><div></div><div> </div><div>Éramos uma turma de cerca de 20 burocratas recém empossados... era nosso primeiro dia no serviço público... faziamos o programa de treinamento que duraria uma semana... tinhamos o passo firme, as colunas eretas, e a esperança no começo de uma vida profissional cheia de desafios e emoções.</div><br /><div></div><div>Foi então que nos encaminharam para o pátio...</div><br /><div></div><div>Lá havia uma tenda branca meio encardida... a tenda havia sido montada bem no meio do pátio e sob ela havia uma mesa de lanches com coxinhas... pasteizinhos... e uma garrafa de refrigerante diet... Tudo levava a crer que os salgados estavam frios e o refri quente...</div><br /><div></div><div>Aquilo já não estava me cheirando bem... </div><div></div><br /><div>Mas foi quando avistei sobre a mesa um micro-system e uma listinha entitulada "<em>exercícios de ginástica laboral-motivacional</em>" é que tive certeza que a coisa iria ficar mesmo feia.</div><div></div><br /><div>Antes mesmo que eu pudesse simular uma dor de cabeça ou algo que me tirasse dali escutei fortes palmas e um grito alegre:</div><br /><div></div><div><em>" Vamo lá gente... todo mundo dando as mãos e fazendo um círculo"</em></div><br /><div><em></em></div><div>Era tarde demais... </div><br /><div></div><div>Virei-me e dei de cara com ela: assim como gorduras, penduricalhos dourados saltavam de tudo quanto é lado... as roupas coloridas e esvoaçantes... a maquiagem pesada... e uma alegria doentia cuidadosamente construída ao longo de milhares de páginas de auto-ajuda...</div><br /><div></div><div>Por medo de ter de pagar uma prenda ainda mais vergonhosa não ofereci resistência e ingressei logo no círculo tirânico daquela gorda.</div><div></div><br /><div>Estavamos todos aterrorizados, pois sabíamos muito bem o que nos aguardava... </div><div></div><br /><div>A gorda nos obrigaria a uma apresentação na qual deveríamos inventar alguma sandice sobre nossas qualidades e defeitos... os mais tímidos seriam entregues para cristo, pois a gorda os faria encenar um teatrinho... haveria uma mini-gincana e deveríamos fingir empenho e competitividade... e para finalizar a gorda ligaria o micro-system e faria tocar uma canção do Lulu Santos ao som da qual todos deveríamos cantar e dançar de mãos dadas...</div><div></div><br /><div>E foi o que realmente houve... </div><div></div><br /><div>Mas algo ainda mais incrível aconteceu. </div><div></div><br /><div>Assim que a música acabou, soltamos logo as mãos suadas do companheiro ao lado... foi quando foguetes começaram a estourar... Provavelmente era algum morador da favela próxima a anunciar a subida das barcas policiais... Mas para a gorda louca os foguetes tinham um significado diferente.</div><br /><div></div><div>Tão logo ela ouviu os foguetes arregalou os olhos e berrou:</div><div></div><br /><div>"<em>Esses foguetes são para vocês gente... vocês merecem... vocês lutaram tanto para chegar até aqui ... e terão uma carreira brilhante... palmas para vocês</em>"</div><div></div><br /><div>E nós, constrangidos, batemos palmas com ela na esperança que tudo aquilo acabasse logo.</div><div></div><br /><div>Depois dos foguetes fomos liberados... sem não antes sermos obrigados a um último suplício: colocar o nome e o email em uma lista de contatos. </div><br /><div></div><div>É que essa lista seria usada pela gorda louca para nos convocar para uma confraternização a se realizar dali a três anos: o "<em>Baile da Estabilidade</em>". </div><div></div><br /><div>Assinei meu nome na lista... falsifiquei um email que não exisitia... e sai dali o mais rápido que pude...</div><br /><div></div><div>Na minha cabeça uma frase martelava: "<em>Meu Deus... essa mulher é louca... essa mulher é louca</em>"</div><div></div><br /><div>Segui andando enquanto olhava para trás... a Sra. L agora dançava sozinha e desengonçada debaixo da tenda... a cada passo que eu dava sua imagem ficava menor e mais gorda...</div><div></div><br /><div>... até virar uma bolinha colorida quicando no meio do pátio cinzento.</div>O Burrocratahttp://www.blogger.com/profile/07882809071894507284noreply@blogger.com5tag:blogger.com,1999:blog-3401444964916031515.post-89554800106386353522009-06-21T19:34:00.000-07:002009-06-21T23:02:05.448-07:00Senhor dos destino<a href="http://4.bp.blogspot.com/_7FVwkIKrvVs/Sj8d932baVI/AAAAAAAAAIQ/I9Qeh_S71aM/s1600-h/3168808846_e58baf87d9.jpg"><img id="BLOGGER_PHOTO_ID_5350027831140903250" style="FLOAT: left; MARGIN: 0px 10px 10px 0px; WIDTH: 178px; CURSOR: hand; HEIGHT: 200px" alt="" src="http://4.bp.blogspot.com/_7FVwkIKrvVs/Sj8d932baVI/AAAAAAAAAIQ/I9Qeh_S71aM/s200/3168808846_e58baf87d9.jpg" border="0" /></a><br /><div>Passam-se burocraticamente os anos... trocam-se as chefias... trocam-se as mesas em courvim e as cadeiras giratórias.... aumentam as minhas dores nas costas. Certas coisas mudam. Mas aprendi desde cedo na carreira que a há coisas que não mudarão nunca. Há coisas que encerram a própria essência angustiada do burocrata: vazios, inércias; ausências; silêncios; carimbos e ofícios...<br /><br /><p>É preciso adaptar-se delicadamente às lerdezas da Repartição ou sofrer as chagas de uma eficiência estéril... Perdendo a dignidade na tentativa de se mostrar útil... Esse é o caso do nosso pobre chefe.</p><p>Desde que a Seção de Contratos lhe enviou um ofício implorando para que nao lhes fossem mais encaminhados Relatórios que não fossem requisitados, que não tinham motivos para existir, e que ocupavam inutilmente espaço na sala de arquivos, o chefe deprimiu-se e não vem trabalhar.</p><p>Ele não vem trabalhar e por consequência a Repartição fica como eu a encontrei hoje...</p><p>Vazia.</p><p>As mesas vazias... o balcão vazio... o secar de uma almofada de carimbo ao relento... e um mosquito que hiberna sobre uma impressora encardida.</p><p>Não havia ninguém.</p><p>Mas eu sabia muito bem onde todos eles estavam. Atravessei as mesas solitárias, passei pela cozinha e já pude ouvir os burburinhos nos fundos. Os vagabundos se reuniam em torno de uma mesa plástica... alguns de pé, outros sentados... mas todos igualmente resguardados sob a sombra daquela árvore feia e mal cuidada... a única em todo o descampado poeirento do quintal.</p><p>Puderam me ver chegando. E perceberam meu olhar inquisitor de quem mesmo sem moral nenhuma para questionar vagabundagens, ainda que saber: "<em>Por que vocês não estão lá dentro?" </em></p><p>Antes que eu abrisse a boca para perguntar qualquer coisa a Sra. P foi logo se adiantando:</p><p><em>"Disseram que a caixa d´água está transbordando e o teto ameaça ceder sobre nossas cabeças... nessas condições não dá para trabalhar."</em></p><p>E voltaram a tagarelar alegremente tal qual crianças desfrutando o horário vago na falta de um professor ao compromisso.</p><p>Eu peguei um café e fiquei por lá a rondar os vagabundos. Aqueles assuntos realmente não me interessavam: receitas de canjiquinha e arroz-doce; relatos de gloriosos feriados no hotel-fazenda; consultas ao médico; diagnósticos desencontrados; e cânceres em família. O único ali que poderia me entreter era o Sr. R- que mais uma vez havia atestado sua sagacidade saindo mais cedo do expediente. </p><p>Ficar ali era perda de tempo. </p><p>Resolvi entrar por dois motivos: 1) Talvez ver de perto a caixa d´água explodir e ser soterrado em meio aos escombros da Repartição fosse a coisa mais emocionante que pudesse acontecer comigo em toda a minha vida de burocrata; 2) Desde que eu botei os pés na Repartição hoje, eu vinha sentindo meu coração palpitar dizendo que algo de importante estava para acontecer.</p><p>Entrei e sentei-me ao balcão.</p><p>Apurei o ouvido para qualquer baruho estranho vindo do teto que anunciasse a catástrofe. Mas eu nada ouvia.</p><p>Fiquei lá a tarde inteira à espera de alguém... um advogado insolente com um falar difícil... um cidadão comum que viesse humildemente pedir uma informação.</p><p>Mas ninguém veio. Os vagabundos também não vieram.</p><p>Já adentrava o fim de expediente... o sol se punha... tudo ficara ainda mais triste... o café ficava mais frio... e eu preparava para deixar o balcão quando ele entrou.</p><p>Era alto... sua presença impunha... e mesmo tentando, não conseguia dissumilar que ele não era. Mesmo debruçando sobre o balcão e escondendo o rosto envergonhadamente por trás dos óculos escuros, não pude deixar de reconhecê-lo. </p><p>Por respeito ao seu esforço, fingi não saber quem ele era. Fingi que não se tratava de um famoso ator que há muito andava desparecido do horário nobre.</p><p>Antes poderoso; rodeado por lindas mulheres; dono de um grande ego semanalmente massageado no Faustão... Agora cabisbaixo; feito um cachorro assustado; implorando por urgência na certidão. </p><p>O que fazer numa situação dessas? Qual é a coisa certa?</p><p>Compadecer de seu sofrimento, driblar todos esses procedimentos burocráticos patentemente inúteis e dar-lhe logo a certidão? Ou por respeito ao brasileiro médio, submetê-lo aos mesmos trâmites que tanto desespero causam às pessoas comuns?</p><p>A vida biônica de burocrata nos impõe dilemas para os quais nossos corações humanos não estão preparados para enfrentar.</p><p>O homem não é um número... a lei não é senhora de nossos destinos.</p><p>Enquanto eu pensava nessa coisas ele irrompeu impacientemente do outro lado do balcão:</p><p><em>"Dá para agilizar? Tenho mil e um compromissos para ontem..."</em></p><p>Ele tornara as coisas mais fáceis...</p><p>Dei-lhe então a lista com todos procedimentos para se obter a certidão... imprimi 3 guias de recolhimento a serem pagas no banco... e orientei-lhe que voltasse daqui a 1 semana.</p><p>E aqui na Repartição até hoje o teto ameaça despencar.</p></div>O Burrocratahttp://www.blogger.com/profile/07882809071894507284noreply@blogger.com5tag:blogger.com,1999:blog-3401444964916031515.post-74979808819435298442009-06-06T06:34:00.000-07:002009-06-06T09:37:11.130-07:00Visão do paraíso<a href="http://2.bp.blogspot.com/_7FVwkIKrvVs/SiqV3ZqEA9I/AAAAAAAAAII/lZSPPJ6_tz4/s1600-h/untitled.bmp"><img id="BLOGGER_PHOTO_ID_5344248686841168850" style="FLOAT: left; MARGIN: 0px 10px 10px 0px; WIDTH: 168px; CURSOR: hand; HEIGHT: 200px" alt="" src="http://2.bp.blogspot.com/_7FVwkIKrvVs/SiqV3ZqEA9I/AAAAAAAAAII/lZSPPJ6_tz4/s200/untitled.bmp" border="0" /></a><br /><div>Foi com espanto que os vagabundos da Repartição receberam a notícia de que a Sra. V, a vagabunda que fazia tudo errado, nunca mais daria as caras por lá.</div><br /><div></div><div>O chefe havia dado a notícia rapidamente e voltado à sua sala, onde continuou se entretendo com pequenos trabalhos inventados. Por sua vez, os outros burocratas presentes reuniram-se na cozinha e puseram-se a fofocar entre goladas de café e farelos de biscoito água e sal.</div><br /><div></div><div>A reunião vagabunda que começara com um furdúncio de protestos indiganados, evoluíra agora para suspiros e cochichos secretos... velório burocrático.</div><div></div><br /><div>A atmosfera era de culpa... É que só agora depois da notícia do frenético chefe percebeu-se que a há quase um mês Sra. V não vinha vadiar na Repartição... Uma alma sequer acusara sua ausência... Tamanha era sua importância para o lento caminhar dos procedimentos cartorários que ninguém perguntara por ela... Sua mesa encontrava-se agora exatamente como a um mês atrás: vazia...</div><br /><div></div><div>Os vagabundo encheram novamente os copos com café e, corroídos pela culpa, inventavam elogios capegas à Sra. N: "<em>Ela era uma ótima servidora... muito prestativa... nunca se atrasava... nunca deixava faltar tinta às almofadas de carimbo... tinha sempre um clipe à mão...</em>". E terminaram dissimulando por unanimidade que sentiriam falta dela.</div><div></div><br /><div>Contemporizada a culpa nos corações e subido o café às cabeças, algumas perguntas vieram à tona...</div><div></div><br /><div>Como pode um modelo de vagabundagem daqueles que era a Sra. N ter sido aposentada por invalidez em função de L.E.R?</div><br /><div></div><div>Ora, esta era doença de gente trabalhadora... estressada... frenética... A menos que tal patologia fosse também causada por preguiçosa paralizia das juntas, a Sra. V não poderia a ter contraído... Haveria a pacata Sra. V aplicado o perigoso golpe do diagnóstico comprado? </div><div></div><br /><div>Era uma possibilidade... nunca se deve subestimar a força com a qual os burocratas perseguem os sonhos da aposentadoria precoce por invalidez.</div><div></div><br /><div>Fuxicar a vida alheia é para um vagabundo mais do que um hábito... é quase um dever. No entanto, mais importante do que desvendar o estranho caso do primeiro servidor público a contrair L.E.R., era resolver a disputa pela mesa da Sra. V.</div><div></div><br /><div>Se a aposentadoria por invalidez é um longínquo sonho ... a mesa da Sra. V passou a ser uma sonhada realidade possível a todos os vadios dali... </div><div></div><br /><div>Era a visão do paraíso burocrático... Uma mesa em courvim limpa ... longe do balcão de atendimento e de estridentes aparelhos telefônicos... completamente escondida por uma pilastra dos bisbilhotamentos do chefe... ventilada de frente por uma ampla janela que convidava um solzinho preguiçoso pela manhã... estirada ao lado do bebedouro.... e logo abaixo de uma verdejante samambaia, que remete a alma mais deseperada e frustrada ao sono e à paz interna.</div><br /><div></div><div>Todos inclusive eu manifestaram vontade em tomar posse da mesa deixada pela Sra. V. </div><br /><div></div><div>Mas eu sabia que minhas chances eram poucas... não gozava de prestígio entre os burocratas... e não estava disposto a ingressar uma longa negociação junto àqueles vagabundos.</div><div></div><br /><div>O velho,tarado e diabético, o Sr D. preferiu continuar em sua mesa próxima ao balcão... Assim poderia conferir mais de perto as advogadas que se aproximavam e com alguma sorte engatar uma constrangedora conversa mole.</div><div></div><br /><div>A disputa ficou então entre dois vagabundo.</div><div></div><br /><div>Um, para angariar apoio, propunha bancar o almoço de toda a Repartição durante 2 meses... O outro se dipunha a deslocar duas linhas telefônicas para a mesa, aliviando os companheiros da irritante tarefa de atendê-los. </div><div></div><br /><div>A Repartição dividiu-se entre esses dois lados. Estavam empatados. E faltava ainda um burocrata a opiniar... </div><div></div><br /><div>Como não poderia deixar de ser, a decisão de minerva estava sobre os ombros do mais experiente e sábio: O Sr. R...</div><div></div><br /><div>O elegante dândi burocrático fumava no quintal alheio ao furdúncio todo causado pela controvérsia da mesa perfeita. </div><br /><div></div><div>Chamado a opinar veio andando ereto e a passos lentos e graciosos rumo à mesa onde todos encontravam-se reunidos. Ao passar pela cozinha encheu um copo de café e entrou esfumaçando o ambiente com seu cigarro.</div><br /><div></div><div>As partes expuseram seus argumentos e seguiu-se um longo silêncio até que o Sr. R começasse a deliberar... </div><div></div><br /><div>Olhando fixo a mesa disputada disse solenemente ao vagabundo que propusera subornar os colegas com almoços pagos: "<em> Nem tudo nesta vida está a venda!</em>".... E ao que havia se proposto a atender as duas linhas que seriam deslocadas para a mesa: "<em>Você está fora do seu juízo? Pretende macular a tranquilidade desta mesa perfeita com dois telefones</em>?".</div><br /><div></div><div>E prolatou sua sentença que por natureza era irrecorrível: "<em>Eu sou o mais antigo de casa, e fico então com a mesa</em>!" </div><div></div><br /><div>Para selar a decisão, o Sr. R, num gesto simbólico, abre a gaveta e joga lá dentro seu maço de cigarros. </div><br /><div></div><div>Nenhum questinamento sobre a decisão surgiu.</div><br /><div></div><div>A questão da mesa estava pacificada. </div><br /><div></div><div>O paraíso tinha um novo dono.</div>O Burrocratahttp://www.blogger.com/profile/07882809071894507284noreply@blogger.com8tag:blogger.com,1999:blog-3401444964916031515.post-17725214782728152172009-05-31T20:13:00.000-07:002009-05-31T23:13:22.558-07:00Anunciação<a href="http://2.bp.blogspot.com/_7FVwkIKrvVs/SiNxEvauENI/AAAAAAAAAIA/h8bSVX5sYL0/s1600-h/kafka.jpg"><img style="MARGIN: 0px 10px 10px 0px; WIDTH: 105px; FLOAT: left; HEIGHT: 119px; CURSOR: hand" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5342237909253492946" border="0" alt="" src="http://2.bp.blogspot.com/_7FVwkIKrvVs/SiNxEvauENI/AAAAAAAAAIA/h8bSVX5sYL0/s200/kafka.jpg" /></a><br /><div><a href="http://1.bp.blogspot.com/_7FVwkIKrvVs/SiNvTKUvlDI/AAAAAAAAAH4/daBj4fER8Uk/s1600-h/kafka.jpg"></a><br /><div><a href="http://3.bp.blogspot.com/_7FVwkIKrvVs/SiNuKS0MvtI/AAAAAAAAAHo/Nw_9hzZFMXg/s1600-h/kafka.jpg"></a><div>Era mesmo um daqueles dias malditos: uma impressora estragada... um carimbo desaparecido... um imbecil que derramou todo o café da garrafa logo na primeira hora de expediente... A essa altura da minha carreira de burocrata, já deveria saber ler esses proféticos sinais de desgraça... </div><div></div><div> </div><div>Um burocrata experiente na vagabundagem, como o Sr. R por exemplo, fareja em pequenas tragédias como essas, o prenúncio de merdas de incalculáveis complexidades... Mas eu, apesar de meus numerosos e dolorosos anos tortos na Repartição, ainda tinha muito a aprender com aquele misterioso homem... </div><br /><div></div><div>Quando eu disse que sairia para almoçar, o respeitado Sr. R, o velho burocrata que ora fumava seu cigarro de palha no quintal, gritou lá de fora:<br /></div><div>"<em>Se eu fosse você não iria</em>" O velho desvairado olhava fixamente o sol, que ardia num céu sem nuvens</div><br /><div></div><div><em>"Por quê? O chefe tá para chegar</em>?"- perguntei-lhe.</div></div><br /><div><div>Mas o Sr. R nada respondeu. Fiquei no vácuo. E ele, a olhar misteriosamente para cima.</div><br /><div>Encenei uma banana mental ao velho e saí para almoçar.</div><br /><div></div><div></div><div>É curioso observar como mesmo levando na bunda várias vezes, e cada vez mais fundo, algumas pessoas não aprendem... Em que estado de fome e loucura estava eu quando fui ignorar uma sugestão do sábio Sr. R? </div><div></div><div></div><br /><div>Só dei conta do meu desvairio quando, sentado à mesa da <em>República do Rango</em> chegara meu PF: </div><div></div><br /><div>"<em>Almôndegas</em>"- deixei escapar num misto de tristeza e revolta.</div><div></div><div></div><br /><div>Bem, o problema não eram as almôndegas em si. Mas sim o fato de eu ter me esquecido completamente de que era quinta-feira...</div><div></div><div></div><br /><div>Explico-me melhor...</div><div></div><div></div><br /><div>É que na <em>República do Rango</em> o cardápio variava segundo uma equação que obedecia a uma lógica cruel de crescentes reaproveitamentos e conservantes químicos... Segunda-feira havia bife; terça, picadinho; a quarta, carne-moída; e quinta, almôndegas...</div><div></div><div></div><br /><div>Era tarde demais para lamentar a falta de prudência em não ter ouvido o Sr. R... </div><div></div><div></div><br /><div>Comi, entrei na fila, paguei, e pus-me no trajeto de 4 quarteirões de volta à Repartição... </div><br /><div></div><div></div><div>Eu caminhava a passos largos... Pois sabia bem que era só uma questão de tempo até que os conservantes começassem a fazer efeito... Sabia muito bem que a dor de cabeça e a sensação de empanzinamento seriam inevitáveis... Minha esperança era que quando os limites do corpo cedessem eu já estivesse no conforto da Repartição... tirando um cochilo na sala de arquivo... escondido por entre caixas de processos empoeiradas... dividindo espaço com fungos esbranquiçados... e traças gordas... </div><br /><div></div><div></div><div>Foi no segundo quarteirão que senti ela vindo... a lombeira.</div><br /><div></div><div></div><div>Eu esperava, ansiosamente e fora da faixa de pedestres, uma brecha no trânsito para atravessar a avenida... </div><div></div><div></div><br /><div>O tempo estava contra mim... meu corpo colapsaria dentro de alguns minutos...</div><br /><div></div><div></div><div>Bem ao longe vislumbrei aliviado uma espaço perfeito entre um palio cinza e o tráfico nervoso e estressado que vinha logo em seguida dele... Era ali ou nunca... </div><div></div><div></div><br /><div>De acordo com meus calculos, bastava aguardar que o palio cinza passasse e aí eu poderia, correndo, atingir o canteiro central sem maiores dificuldades.</div><div></div><div></div><br /><div>Segundos mais tarde eu perceberia que eu calculara mal... O palio cinza vinha bem mais lento do que eu imaginava, e os carros de trás bem mais frenéticos... Logo logo, aquele tranquilo espaço que me permitiria uma gloriosa travessia seria engolido pelo intermonável fluxo de carros, motos, vans, lambretas e caminhões...</div><br /><div></div><div></div><div>Pronto era o fim... ela chegou finalmente! Meus passos desnortearam-se... senti fincadas pulsarem fundo no cérebro... meus olhos incharam... tudo me parecia embaçado... era a lombeira mais forte dentre todas as que eu já havia experimentado... Nem litros e litros de café me trariam de volta às condições normais nas próximas horas... </div><div></div><div></div><br /><div>Só me restava esperar o palio cinza passar, e caso tivesse forças gritar-lhe algumas impropriedades... canalizar toda minha desgraça e ódio na figura daquele motorista lerdo.</div><br /><div></div><div></div><div>Aguardei então o palio cinza...</div><div></div><div></div><br /><div>Entorpecido pela moleza e sob o calor escaldante do sol de meio-dia, ele vinha lentamente... pude ouvir que o rádio sintonizava um bolero... Eu só não estava preparado para o que ver o que vi... não podia ser verdade... era a lombeira que agora me pregava peças?</div><div></div><div></div><br /><div>Aquele braço para fora da janela ostentando um cigarro de palha... a blusa azul desbotada... os cabelos brancos:</div><div></div><div></div><br /><div>Era o Sr. R! </div><div></div><div></div><br /><div>Elegante, imponente, e ao som de um bolero... o velho deslizava o palio vagarosamente pelas ruas... </div><div></div><div></div><br /><div>Numa jogada de mestre o Sr. R simplesmente pegou o carro e foi embora antes mesmo da metade do expediente...</div><div></div><div></div><br /><div>Alucinado sob os efeitos dos conservantes, pensei em como deveria ter ouvido aquele homem... e no quanto deveria aprender com ele... mas isso são águas passadas... não adianta chorar pelo leite derramado... devemos levantar a cabeça e enfrentar a vida...</div><div></div><div></div><br /><div>Agora era preciso que eu me concentrasse na única coisa que importava ali naquele momento: não ser atropelado!</div></div></div>O Burrocratahttp://www.blogger.com/profile/07882809071894507284noreply@blogger.com3tag:blogger.com,1999:blog-3401444964916031515.post-31360091380359155562009-05-22T21:46:00.000-07:002009-05-24T10:46:32.221-07:00O mundo da lua<a href="http://3.bp.blogspot.com/_7FVwkIKrvVs/Shl0_CCnHcI/AAAAAAAAAHg/HN95b_0WvPc/s1600-h/sun.png"><img id="BLOGGER_PHOTO_ID_5339427459452837314" style="FLOAT: left; MARGIN: 0px 10px 10px 0px; WIDTH: 167px; CURSOR: hand; HEIGHT: 151px" alt="" src="http://3.bp.blogspot.com/_7FVwkIKrvVs/Shl0_CCnHcI/AAAAAAAAAHg/HN95b_0WvPc/s200/sun.png" border="0" /></a><br /><div><div>É muito comum cozinhar em pleno expediente. </div><br /><div></div><div>Mas organizar um almoço para os vagabundos da Repartição era um processo complexo cuja gestação deve começar lá por volta das 9 horas da manhã. </div><br /><div></div><div>Primeiro era preciso que algum infeliz propusesse o cardápio e, contrariando a inércia burocrática, orçasse as compras e fizesse circular um envelope dentro do qual deveriam tilintar moedas sujas em meio a notas amarrotadas de pequeno valor...</div><br /><div></div><div>Isso pode parecer simples, mas na verdade é algo que demanda mais trabalho do que o serviço de todos os vagabundos juntos durante uma semana inteira. </div><div></div><br /><div>São várias as dificuldades envolvidas no processo: </div><div></div><br /><div>1) nunca há unânimidade quanto ao cardápio do dia. Enquanto uns querem costelinha, outros querem frango ou bife à milanesa;</div><br /><div></div><div>2) O envelope costumam circular por quase uma hora por entre as mesas da Repartição até que seja levantado um montante decente para as compras. </div><br /><div></div><div>3) A Dona N., faxineira que é desviada de sua função para fazer o almoço, quando via aquele dinheiro circulando, antecipava-se ao prelúdio de sua desgraça e sumia furtivamente.... É preciso mandar alguém investigar seu paradeiro pela Cantina, e por outros becos escuros do prédio onde ela costuma se esconder.</div><br /><div></div><div>4) Na hora de lavar a louça é necessário proceder outra busca à Dona N., que desaparecia novamente.... E dessa vez as chances de encontrá-la eram significantemente menores... isso pois são muitas as variáveis que contam a favor da Dona N como o fato de estarem todos empazinados, e já com início de dores de cabeça provocados pela comida... Assim, a louça sempre sobrava para algum vagabundo.</div><div></div><br /><div>Considerados todos esses inconvenientes sempre fui incisivamente contra os almoços no expediente... </div><div></div><br /><div>Fora que não acho certo unir duas ou três mesas, sem ao menos estender uma toalha, e sair lambuzando processos, e ofícios com molhos e gorduras... </div><br /><div></div><div>É que com o tempo fui levado a sustentar um estranho respeito por essas cadeiras giratórias, por essas mesas em courvim, e pelo traças e mofos que saem desses processos que ora querem engordurar... Aprendi que aqui é o lugar do silêncio, da meditação frustrada, e do sono constante... Para sobreviver ao expediente, a Repartição exige de nós certo grau de melancolia e austeridade... </div><div> </div><div></div><div>E por isso mesmo dispensei solenemente o envelope <em>pidão</em> que haviam colocado em minha mesa... </div><div></div><br /><div>Mesmo branco de fome, agradeci a atenção e inventei que já tinha almoçado...</div><br /><div></div><div>Ainda assim eu sofreria a tortura de ver os vagabundos rodeando a mesa tal qual primatas... prontos para lambuzar tudo no que conseguirem por as mãos.</div><br /><div></div><div>Eu e a Dona N. dividiamos a frustração... Ela, por eles sujarem a louça; e eu, por eles desrespeitosamente engordurarem a Repartição.</div><div></div><br /><div>Mas era preciso esfriar a cabeça... eu andava muito estressado... muito nervoso... e como de hábito muito frustrado... era preciso relaxar... viver mais leve... ver o melhor em cada uma daquelas pessoas... </div><div> </div><div>Mas enquanto eu não estivesse preparado para isso era melhor tentar ignorar aquela cena grotesca.</div><div></div><br /><div>Então sentei-me frente ao computador... abri o explorer e digitei lá : <a href="http://www.nasa.gov/">http://www.nasa.gov/</a></div><div></div><br /><div>Como era lindo o Cosmos! </div><div> </div><div>Havia um mundo fantástico lá fora... onde as pessoas eram competentes... onde se faziam coisas importantes... descobertas incríveis...</div><br /><div></div><div>Quando criança, lembro-me claramente de ter dito a meu pai que seria astronauta quando crescesse... </div><br /><div></div><div>E minhas notas em matemática eram até boas... </div><br /><div></div><div>Aí eu me pergunto:</div><br /><div></div><div><em>"ONDE FOI QUE EU ERREI?"</em></div></div>O Burrocratahttp://www.blogger.com/profile/07882809071894507284noreply@blogger.com3tag:blogger.com,1999:blog-3401444964916031515.post-74051012649848040232009-05-17T18:02:00.000-07:002009-05-18T19:51:58.805-07:00No covil dos morcegos<a href="http://4.bp.blogspot.com/_7FVwkIKrvVs/ShD65SeELWI/AAAAAAAAAHQ/37_BT3pMWQQ/s1600-h/babel-brueghel-2.jpg"><img style="MARGIN: 0px 10px 10px 0px; WIDTH: 189px; FLOAT: left; HEIGHT: 200px; CURSOR: hand" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5337041420551466338" border="0" alt="" src="http://4.bp.blogspot.com/_7FVwkIKrvVs/ShD65SeELWI/AAAAAAAAAHQ/37_BT3pMWQQ/s200/babel-brueghel-2.jpg" /></a><br /><div>A tentativa de chegar à Cantina do prédio anexo pelo quintal tinha me custado os sapatos... meu <em>mocassin</em> de burocrata já havia sido encardido por completo pela lama do descampado.</div><br /><div></div><div>Eu bem podia ter evitado todo os inconvientes dos fundos: a lama, o matagal, os mosquitos da dengue... </div><div></div><br /><div>Eu poderia ter saído pela porta da frente num agradável passeio até a lanchonete da esquina... passar pela banca de revistas... zanzar pelos corredores do supermercado... fazer meia dúzia de jogos na loteria... pagar uma conta de luz... tudo isso antes ou depois de beber um mate-couro e comer uma esfirra.</div><div></div><br /><div>Mas infelizmente hoje eu deveria me contentar com a Cantina do prédio anexo.</div><div></div><br /><div>Lá era um dos poucos lugares nessa cidade em que se ainda vende fiado... e como eu havia esquecido a carteira em casa, não me restava outra escolha... Ou eu enfrentava os salgados horrorosos da Cantina... ou passava o resto do expediente bebendo café de barriga vazia.</div><div></div><br /><div>Passei então pelo quintal e cheguei lá... </div><div></div><br /><div>A Cantina era um grande salão mal iluminado e úmido... escondido no final de um corredor remoto... o teto despencava em infiltrações... Era um lugar esquecido pelos burocratas... raríssimas vezes algum vagabundo dava caras por lá... </div><div></div><br /><div>Como eu, todos preferiam passear na hora do lanche... O fato da Cantina ser um lugar deserto contribuiu para que, com o tempo, aquele espaço virasse um ponto de encontro para os boys, faxineiros e vagabundos dos serviços geraes...</div><div></div><br /><div>Era para lá que essas pessoas, não propriamente burocratas, mas tão avessas ao trabalho quanto nós, passavam horas escondidas... tagarelando... gritando impropriedades... contando piadas e lendo o Super do dia anterior...</div><div></div><br /><div>Fui seguindo pelo corredor e pude ouvir o burburinho que vinha da Cantina... </div><div></div><br /><div>Assim que entrei, pude contar lá dentro cerca de vinte vagabundos... o clima de vadiagem era total... estavam todos escorados pelas paredes ou sentados no chão...</div><div></div><br /><div>Ao me virem entrar, todos calaram-se... mesmo de <em>mocassin</em> sujo minha presença chegou a impor certo respeito... </div><div></div><br /><div>O clima era tenso... eu sabia que não era bemvindo ali... </div><div></div><br /><div>E eu sabia que assim que pedisse um salgado fiado os meus 15 segundos de respeito cairiam por água abaixo e eu seria motivo de escárnio na boca desse bando de vadios até o dia da minha aposentadoria...</div><div></div><br /><div>Mas o inesperado aconteceu...</div><div> </div><div>Entrou pela porta da Cantina um boy desavisado de minha presença... o vagabundozinho vinha andando malacozamente... balangando forçadamente os braços por detrás das costas e pisando firme... pensando abafar: </div><div></div><br /><div><em>- Fala morcegada! -</em> gritou para a Cantina.</div><div><em></em></div><br /><div>O silêncio fez o clima ainda mais tenso...o constrangimento abateu-se sobre todos... e aos poucos a Cantina foi esvaziando envergonhadamente... cabisbaixa...</div><div></div><br /><div>Na verdade aquele boy maloqueiro havia me feito um favor. Agora poderia pedir um salagado fiado sem olhares reprovadores. </div><div> </div><div>Aproximei-me da moça que atendia no balcão... Ela tinha os olhos esbugalhados numa cara de poucos amigos. Antes que eu dissesse qualquer coisa ela foi logo disparando:</div><div></div><br /><div><em>- Cambada de vagabundo! Vai arrumar uma privada para desintupir!</em><em> Morro de raiva desse povo! E fico com pena de vocês servidores públicos que morrem de trabalhar e nem tempo tem de vir aqui fazer um lanche tem... Enquanto isso esses vagabundo ficam aqui o dia inteiro morcegando... até colchão no chão pra dormir eles colocam...</em></div><div></div><br /><div>O ódio e a injustiça sentidos por aquela mulher eram reais e estavam esbugalhado em seus olhos... E a minha vergonha de burocrata estava estampada na minha cara... mas ela não via. </div><div> </div><div></div><div></div><div>Ela realmente acreditava que nós burocratas trabalhavamos? </div><div> </div><div></div><div></div><div>Ou seria a mente dela que, no afã de autopreservar a sanidade, alucinara subterfúgios para esconder o fato de que ela era a única alma em todo o prédio que pegava no batente...</div><div> </div><div></div><div>Não era possível que a moça esbugalhada tivesse tamanha fé no zelo e profissionalismo dos burocratas. </div><div> </div><div></div><div>Ela estava mesmo doente... a pobre moça sofria de febris alucinações... Tive vontade de abraçá-la... de dizer a ela que as coisas iriam mudar... que alertaria o Diretor e ele os colocaria todos no olho da rua... mas não pude.</div><div></div><br /><div>Olhei para a coxinha que transbordava na gordura, para o molho de pimenta que estava sobre o balcão e para os olhos da moça que me fitavam à espera de uma resposta confortadora.</div><div></div><br /><div>Mas a única coisa a meu alcance que poderia consolá-la era, com a ajuda daquela coxinha... daquela pimenta... e de algum rolo de papel higiênico, dar àquela morcegada um diarréico trabalho para fazer.</div>O Burrocratahttp://www.blogger.com/profile/07882809071894507284noreply@blogger.com7tag:blogger.com,1999:blog-3401444964916031515.post-31637477898038006992009-05-09T07:33:00.000-07:002009-05-11T07:59:54.040-07:00O pardal maldito<a href="http://4.bp.blogspot.com/_7FVwkIKrvVs/SgfGN3lbarI/AAAAAAAAAHI/lEcpOOKFD64/s1600-h/imagesCAZ1C2U5.jpg"><img id="BLOGGER_PHOTO_ID_5334450225205177010" style="FLOAT: left; MARGIN: 0px 10px 10px 0px; WIDTH: 103px; CURSOR: hand; HEIGHT: 130px" alt="" src="http://4.bp.blogspot.com/_7FVwkIKrvVs/SgfGN3lbarI/AAAAAAAAAHI/lEcpOOKFD64/s200/imagesCAZ1C2U5.jpg" border="0" /></a><br /><div>A cena era patética: o corpo todo torto na cadeira; as mãos inertes sobre o teclado; a boca meio aberta e os olhos atentos num pardal raquítico e feio que me encarava de cima do muro...</div><br /><div></div><div>Era sempre assim... bastava eu sentar perto da janela e me acometiam distrações, dispersões e paranóias de toda sorte... </div><div></div><br /><div>Enquanto isso o serviço que deveria, em tese, ser feito acaba sendo protelado para uma outra hora... um outro dia... uma outra semana... e enfim o dia de São Nunca!</div><div></div><br /><div>Já era a quinta vez que eu refazia aquele mesmo bendito ofício. Os erros consecutivos vinham causando em mim um estado de crescente agonia. </div><div></div><br /><div>À medida que eu identificava um erro aparecia outro no lugar, o que fez necessárias até o momento quatro tentativas : 1) tinha vírgula fora do lugar; 2) havia dois pontos finais seguidos ; 3) a numeração do ofício estava errada; 4) havia um erro ortográfico grosseiro...</div><div></div><br /><div>A cada tentativa a minha ansiedade crescia mais... </div><br /><div></div><div>Meu coração disparara, as mãos tremiam, um sorriso travado repuxou-me o rosto, e senti minha bexiga contrair-se subitamente... estava a ponto de me mijar as calças. </div><br /><div></div><div>Levantei-me da cadeira com as pernas trêmulas e balancei os braços desengonçadamente em direção ao pardal maldito que me espiava da janela... minha intenção era espantá-lo dali... aquele pardal era culpado de tudo, era ele que me tirava a concentração!</div><br /><div></div><div>Eu balançava os braços cada vez mais agressivamente, e o bicho continuava a me ignorar solenemente... </div><br /><div></div><div>Havia uma advogada no balcão que se encontrava bastante preocupada com a minha situação... por duas vezes me perguntara se estava tudo bem... Certamente imaginava que eu estava apresentando sintomas preliminares de um ataque epilético. </div><br /><div></div><div>Sentei-me, fechei os olhos, e coloquei todos meus esforços em pensamentos positivos: "<em>Desta vez vai... fique calmo... não se desespere... não olhe para o pardal... agora você vai fazer de uma vez esse ofício... tomar um café... e tirar o resto da semana de folga</em>... <em>afinal</em>, <em>você merece!</em>" </div><div></div><br /><div>E assim eu procedi às correções pertinentes; e dei o comando de impressão.</div><div></div><br /><div>Peguei os ofícios com as mãos trêmulas e frias... meu coração saltava pela boca... hesitei em lê-lo... senti que havia alguma coisa errada com ele... meu sexto sentido burocrático palpitava.</div><br /><div></div><div>Eu o tinha relido antes na tela do computador 3 vezes antes de mandar essa impressão... mas na tela é uma coisa, na folha é outra... é sempre assim... é a lei da impressão e do desperdício de papel!</div><br /><div></div><div>E realmente meu sexto sentido estava correto...</div><br /><div></div><div>Quando reli aquele ofício que eu tinha em minhas mãos não pude acreditar como erros como aqueles tinham surgido no processo de redação, muito menos como puderam passar desapercebidos na leitura que fiz ainda na tela do computador.</div><br /><div></div><div>Por entre 4 ou 5 frases simples e de pouca complexidade que compunham o corpo do texto, haviam sido inseridas intercaladamente e sem nexo algum com o texto as palavras: "<em>pardal"; " passarinho" e "</em> <em>avião".</em></div><div></div><br /><div>Olhei pela janela, o pardal não estava mais lá...Olhei para o balcão de atendimento, a advogada também tinha se ido...</div><br /><div></div><div>Uma lágrima desesperada correu o meu rosto...</div><div> </div><div>Corri para a cozinha e peguei um copo de café... De lá podia ver o Sr. R, ele contemplava o céu azul... </div><div> </div><div>Aquele homem era mesmo um exemplo para todos nós... Vinte anos de serviço público e nenhuma ruga de preocupação ou desespero...</div><div></div><br /><div>"<em>É preciso exercitar a positividade do pensamento... para ser feliz devemos saber lidar com essas situações de stress que nos acometem no dia a dia... tirar delas o melhor ensinamento</em>..."-ponderei, olhando para o Sr. R, enquanto tentando me acalmar.<br /></div><div>"<em>Existe pardal no jogo do bicho</em>?"- perguntei -lhe</div>O Burrocratahttp://www.blogger.com/profile/07882809071894507284noreply@blogger.com3tag:blogger.com,1999:blog-3401444964916031515.post-58808450095976979892009-04-30T20:42:00.001-07:002017-04-03T10:46:08.538-07:00O termidor<a href="http://2.bp.blogspot.com/_7FVwkIKrvVs/Sfp3ZFHBkkI/AAAAAAAAAHA/WJsVGnZBNLQ/s1600-h/tshirtprofburocrata.jpg"><img alt="" border="0" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5330704381698478658" src="https://2.bp.blogspot.com/_7FVwkIKrvVs/Sfp3ZFHBkkI/AAAAAAAAAHA/WJsVGnZBNLQ/s200/tshirtprofburocrata.jpg" style="cursor: hand; float: left; height: 200px; margin: 0px 10px 10px 0px; width: 180px;" /></a><br />
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Todo mês eles apareciam do nada... distribuíam alguns panfletos incendiários... falavam vagamente sobre fazer uma greve... pregavam mentiras deslavadas sobre aumentos que levariam nossos vencimentos às alturas... contavam uma fofoca vexatória sobre algum juiz... distribuíam tapinhas nas costas... bebiam do nosso café... e saíam sorrindo, repetindo a mesma nojenta saudação: "<em>tchau pessoal, até a próxima</em>"...</div>
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Eram os frouxos do Sindicato...</div>
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Vagabundos odiados pela grande maioria dos burocratas...</div>
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Há quem diga que todos nutrem uma inveja por esses homem e mulheres mal vestidos, que aparecem mensalmente nos panfletos sindicais apertando a mão de algum deputado babão...</div>
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E é possível que seja mesmo inveja o que todos sentem...</div>
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Afinal, a chapa eleita fica isenta de bater ponto durante todo o mandado... Faça idéia do que eles aprontam enquanto a maioria dos burocratas estão trancafiados numa Repartição mofada, escura, sujeitos à programação da rádio Antena 1 durante todo o expediente...</div>
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Os do Sindicato são apelidados "vagabundos duplos"; "burocratas biônicos"; "borra-botas"; "os da-lua"; ou simplesmente "zeros à esquerda"</div>
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Mas nem sempre foi assim</div>
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Quando o presidente do Sindicato era o Sr. M tudo era diferente...</div>
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Homem de idade, barriga, e careca avançadas... vestindo excentricamente seu terno jeans, de um azul há muito desbotado... desfilava por entre as Repartições como um general em revista à tropa...</div>
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Se o homem dizia que era greve, era greve mesmo... e quem se aventurasse a furar, que agendasse de uma vez o martelinho de ouro e o borracheiro pois as retaliações eram sérias... impunidade não existia para aquele homem... Foi amado por muitos, e temido pela maioria...</div>
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Reelegeu-se por mais 3 mandados e durante todos esses anos à frente do sindicato havia logrado conquistas homéricas: durante a Era M. o vencimento dos servidores mais que dobraram... bônus e gratificações brotavam pelas folhas de pagamento... relógios de ponto desapareciam misteriosamente... mulheres bonitas davam as caras nas festas de fim de ano... e até o café era mais gostoso.</div>
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Certa feita uma juíza recém- empossada acertou em cheio um tapa na cara do porteiro que lhe tentava impedir de adentrar o Tribunal com seu poodle...</div>
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E isso chegou aos ouvidos do Sr. M.</div>
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No dia seguinte o cachorro foi encontrado morto... largado nos degraus da escada de incêndio... tinha sofrido uma intoxicação alimentar combinada com uma diarréia aguda.</div>
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Amargando a morte do animal, a juíza deixou-se abater por um quadro de depressão profunda da qual nunca chegou a sair... acabou sendo aposentada por invalidez.</div>
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Aqueles tempos eram outros... sentíamos que éramos parte de algo maior e mais belo do que a Repartição... Éramos respeitados e temidos... não ríamos de piadinhas de juiz... vivíamos a alegria da ditadura maltrapilha e de baixo escalão... a burocracia-proletária estava no poder.</div>
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Hoje os burocratas andam cabisbaixos pelos corredores e pelas Repartições... tremem ao ver a figura do juiz... são extorquidos por flanelinhas das imediações e destratados por advogados... aquela placa com os dizeres "é crime desacatar funcionário público no exercício de sua função" não ostenta mais o brilho de antigamente, e já não se encontra nos balcões de atendimento...</div>
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Vivemos tempos sombrios desde que o Sr. M se foi...</div>
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O Sindicato hoje é uma piada de mau gosto.</div>
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Suga as contribuições sindicais e fretam um ônibus para um excursão farofenta a alguma cachoeira das redondezas durante o feriado emendado... promove festas de fim de ano horrorosas, frequentadas por pessoas igualmente horrorosas, numa churrascaria qualquer....</div>
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O velhote nos abandonou, aposentou-se e mudou para o sul de Minas com a esposa... Envelhece cada dia imerso numa terma mineral diferente, de onde sai todo enrugado ao cair da noite... Sentiria ele falta dos tempos em que reinava absoluto pelas Repartições?</div>
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E nós aqui também envelhecemos...</div>
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O que precisamos é de uma ideologia que nos faça rejuvenescer... fazer barulho... criar tumulto... lutar por qualquer coisa, por mais insana e absurda que possa parecer... assediar advogadas nos corredores... sair pelas ruas com um copinho de café na mão e um botom amarelo no peito:</div>
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"<em>Aumento já</em>!"</div>
O Burrocratahttp://www.blogger.com/profile/07882809071894507284noreply@blogger.com4tag:blogger.com,1999:blog-3401444964916031515.post-6170244004229279452009-04-22T18:45:00.000-07:002017-04-03T11:17:04.646-07:00Um distinto cavalheiro<a href="http://1.bp.blogspot.com/_7FVwkIKrvVs/SfFYbDlhzvI/AAAAAAAAAGw/rnJ71oku7oI/s1600-h/magritte.jpg"><img alt="" border="0" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5328137055998430962" src="https://1.bp.blogspot.com/_7FVwkIKrvVs/SfFYbDlhzvI/AAAAAAAAAGw/rnJ71oku7oI/s200/magritte.jpg" style="float: left; height: 114px; margin: 0px 10px 10px 0px; width: 94px;" /></a><br />
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<a href="http://4.bp.blogspot.com/_7FVwkIKrvVs/Se_msaLhi7I/AAAAAAAAAGg/_in5XOU5f8I/s1600-h/d4e8b723d6e9f6a8.jpg"></a><br />
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Era um lindo dia de sol. E como de costume eu estava atrasado para mais um expediente vegetativo na Repartição...</div>
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Girei a maçaneta da porta, e antes mesmo de adentrar a Repartição, já me vinha na cabeça aquela cena usual...</div>
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Vislumbrei as mesas desorganizadas e ociosas... senti cheiro de cigarro e café que vindo da cozinha... vi alguém escornando a corcunda em alguma cadeira giratória frouxa... e é claro, vi aquela vagabunda fofocando no telefone algo sobre casamentos e divórcios...</div>
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Enfim, a típica e frustrada cena do nosso cotidiano burocrático e mofado.</div>
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Mas hoje as coisas tiveram um rumo diferente!</div>
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Abri aquela mesma porta, da mesmíssima maneira que venho fazendo a anos...</div>
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Desta vez, um cenário excitante, de mil e uma possibilidades se abriu diante de meus olhos de cansados e desiludidos de burocrata...</div>
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Foi menos com espanto do que com uma alegria incontida que constatei:</div>
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<em>"O caos e a discórdia haviam se instalado na Repartição!"</em></div>
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Os vagabundos encontravam-se todos, sem exceção, de pé... contemplando igualmente incrédulos e excitados a discussão entre o Sr. R e a Sra. I...</div>
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Pelo que pude entender um lápis fora o começo da coisa toda.</div>
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O Sr. R havia pegado sem permissões um lápis da mesa da Sra. I; e pôs-se a fazer algumas ligações, tomando notas junto a todos os canis da cidade procurando por algum pastor alemão para cruzar com sua cadela...</div>
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Até aí tudo bem!</div>
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No entanto, uma vez tendo anotado informações sobre preços, divisões da cria entre os contratantes, etc. Ele havia colocado novamente na mesa da Sra. I o lápis emprestado... e esse tinha agora a ponta quebrada, e a borracha da outra extremidade completamente comida, inultilizada...</div>
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Foi então que a Sra. I, já com muito café na cabeça, no auge dos seus 100 quilos e dos 20 anos de frustração burocrática, começou:</div>
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<em>"Isso é um absurdo! Uma blasfêmia! Uma profanação!",-</em> ensaiava verborragias de efeito.</div>
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O Sr. R, homem de postura muito nobre e de muita objetividade, foi logo no x da questão:</div>
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<em>"Não se faça de rogada... para que você usa esse lápis? Você não faz nada o dia inteiro! Não escreve nada, e muito menos tem o que apagar..."</em></div>
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Eu nutria certo respeito e adminiração velada pelo Sr. R...</div>
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Esse velho, era um burocrata à frente do nosso tempo... há muito decidira deliberadamente se desligar das preocupações que nos acometia, transcendendo sua consciencia burocrática à um estágio superior...</div>
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Ele simplesmente ignorava solenemente as ordens do chefe... não se preocupava em fingia estar trabalhando, nem mesmo na presença de juízes e altas autoridades... não desejava bons-dias a ninguém...</div>
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Lembro-me com clareza da naturalidade e da polidez com que, certa feita, telefonara ao Setor de Informática para pedir suporte na instalação de um programinha para jogar poker-online...</div>
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Era um verdadeiro gentleman... um dândi pobre a vegetar nas repartições públicas... um lorde até nas horas mais críticas... mas agora havia ido longe demais...</div>
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Fato é que há um código de conduta não-escrito entre os burocratas... para muita coisa se fecha os olhos... e a omissão deve ser por excelência a materialização de nossa conduta...</div>
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Mas o Sr. R acabara de quebrar a regra de ouro desse código: "<em>um burocrata em hipótese nenhuma chama um outro burocrata de à toa</em>"...</div>
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E aquele sábio homem tinha ciência do que acabara de fazer... Arriscaria dizer que estava arrependido a essa altura, mas mantinha um olhar nobre e ostentava ainda a pose da razão com fina dignidade...</div>
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Enquanto isso os outros vagabundos consolavam a Sra. I, que chorava soluçando como criança gorda e indefesa...</div>
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Decidiu-se implicitamente, por solidariedade à Sra. I, dar um gelo no Sr. R... mesmo sabendo todos que aquele homem não se afetava por coisas do tipo...</div>
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A essas alturas ele já pegara outro lápis e pôs-se novamente a procurar pelo pastor alemão que fecundaria sua cadela... como não havia papéis por perto, fazia as anotações na própria mesa em courvim...</div>
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Eu pensei desconsolado, enquanto tomava um cafezinho na cozinha:</div>
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"<em>Não que ele se importe, mas passará o resto dos dias ignorado... Isso é ultrajante! Um homem como ele não pode ser simplesmente colocado na geladeira por ter falado a verdade... pobre Sr. R, vítima de seu desapego e de sua moralidade niilista.</em>"</div>
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Uma coragem foi me tomando enquanto o café me subia a cabeça:</div>
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"<em>Vou sair em defesa dele... aceitemos nossa condição vagabunda, porém sejamos racionais... A verdade deve prevalecer... a verdade é nobre... portanto, a vagabunda deve aceitá-la, e o Sr. R deve ser perdoado</em>"- arrisquei baixinho esse discurso infâme e desarticulado, e rumei para a sala da Repartição.</div>
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Chegando lá mais uma surpresa...</div>
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Todos, estavam ao redor do Sr. R, escutando atentamente o que dizia... inclusive a Sra. I!</div>
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Dele emanava uma atmosfera de respeito que se expandia por toda a sala. Todos os olhos vidravam-se nos seus... ele fazia gestos com tranquilidade e classe... e sobre a mesa da qual discursava aos outros vagabundos se espalhavam dezenas de volantes da mega-sena...</div>
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<em>"Vejam vocês, há um padrão entre a distribuição dos números sorteados nos 4 quadrantes dos volantes com os resultado do jogo do bicho..."-</em> explicava o Sr. R.</div>
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Não tardou para que eu entendesse do que se tratava...</div>
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A mega-sena estava acumulada... e os vagabundos decidiram tentar um bolão. E para isso foram pedir ajuda ao Sr. R... É que ele, com os métodos que desenvolvera durante as horas-mortas do expediente, já acertara 3 vezes a quadra e 1 vez a quina...</div>
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Era o dinheiro unindo as pessoas! O sonho brasileiro de ganhar na loteria e passar o resto da vida churrascando coçou no coração de cada um, e falou mais alto...</div>
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E assim uma segunda chance foi dada ao Sr. R...</div>
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Três acertos na quadra e um na quina...</div>
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Aquele velho era o único entre nós que tinha algum futuro!</div>
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O Burrocratahttp://www.blogger.com/profile/07882809071894507284noreply@blogger.com7tag:blogger.com,1999:blog-3401444964916031515.post-68150419448027925862009-04-16T21:35:00.000-07:002009-04-18T17:30:06.734-07:00Medo e delírio na Repartição<a href="http://2.bp.blogspot.com/_7FVwkIKrvVs/SeoyEMiNotI/AAAAAAAAAGY/ZDPErp7j3CM/s1600-h/avc3.JPG"><img id="BLOGGER_PHOTO_ID_5326124556984623826" style="FLOAT: left; MARGIN: 0px 10px 10px 0px; WIDTH: 198px; CURSOR: hand; HEIGHT: 200px" alt="" src="http://2.bp.blogspot.com/_7FVwkIKrvVs/SeoyEMiNotI/AAAAAAAAAGY/ZDPErp7j3CM/s200/avc3.JPG" border="0" /></a><br /><div>O Chefe-Workaholic mais uma vez sofria um ataque de falta do que fazer... </div><br /><div></div><div>Por algum motivo quando ia acabando o verão e o tempo começava a esfriar; as crises e ataques nervosos se tornam mais frequentes, trazendo uma série de inconvenientes ao ócio habitual... </div><div></div><br /><div>Os doentios episódios começam com ele pisando forte, pra lá e pra cá pela Repartição... e abrindo armários. No próximo estágio ele passa a rondar as mesas dos vagabundos como um predator à espreita... Daí escolhia aquele servidor que mais aparentava estar de bem com a vida e a ele passava um trabalho inútil qualquer... na maioria das vezes um relatório, que acabava no lixo antes que alguém o lesse...</div><br /><div></div><div>Vi ele olhar de soslaio para minha mesa... era um mau presságio! </div><div></div><br /><div>Vendo-o esboçar uns passos em minha direção, levantei-me e segui rapidamente para o banherio... e lá me tranquei por uns instantes até ele se acalmar.</div><div></div><br /><div>Só saí quando constatei que os passos frenéticos pela Repartição haviam cessado. "<em>Parece que tudo voltou ao normal</em>", pensei.</div><div></div><br /><div>Agora ele recebia o Oficial de Justiça que acabara de voltar das ruas onde fora cumprir um mandado de intimação...</div><div></div><br /><div>Sentado na minha mesa eu podia ver os dois... O Oficial tinha o mesmo ar cansado e frustrado de qualquer outro burocrata... Já o Chefe-Workaholic parecia bastante excitado. </div><div></div><br /><div>É que tendo o Oficial cumprido o mandado de intimação, ele poderia agora trabalhar naquele processo que estava parado há meses em sua mesa... </div><div> </div><div></div><div></div><div></div><div>Finalmente ele poderia, como gostava de dizer, "<em>dar andamento ao feito"...</em> Agora sim, teria uma tarde inteira de burocracias, certidões, carimbos, despachos e ofícios ... Seu coração palpitava de vontades...</div><br /><div></div><div><em>"Então conseguiu encontrá-lo finalmente</em>?", perguntou com a voz trêmula de prazer antecipado, já deixando escapar um sorrisinho nervoso.</div><br /><div></div><div>"<em>Sim... veja bem... eu...".</em> </div><br /><div></div><div>"<em>Ótimo Sr. I, passe pra cá a intimacão que imediatamente darei andamento ao feito... nos termos da nova Legislação proceder-se-á um rito especial de maneira que..."-</em> interrompeu o Chefe frenético.</div><div><em></em></div><br /><div><em>"É que eu não pude o intimar..."</em></div><br /><div></div><div>"<em>O quê?",</em> protestou o Chefe. </div><br /><div></div><div>"<em>Ele encontra-se no hospital... sofreu um AVC e está com uma espécie de bolha no cérebro... os médicos lhe deram 2 dias de vida. Dois dias é tudo que ele tem</em>".</div><br /><div></div><div>Estarrecido, o Chefe baixou o olhar... um silêncio fúnebre se instalou entre os dois... Ele estava submergido nos mais selvagens pensamentos burocráticos. ... Eu tinha alguma idéia do que aquele demente espírito lógico-formal maquinava. </div><br /><div></div><div><em>"Diga... ele consegue assinar? mover as mãos</em>?", perguntou o Chefe.</div><div></div><br /><div><em>"Creio que não... o homem tem os olhos constantemente arregalados; a boca toda roxa e torta fica aberta e babando; as necessidades ele faz por meio de uma sonda... 2 dias é tudo que ele tem... Ainda que pudesse assinar, não seria mais coerente mandar arquivar esse processo? Afinal o que representa uma multa de R$ 51,75 para um homem que tem 48 horas de vida?",</em> ponderou o Oficial de Justiça.</div><div></div><br /><div><em>"Veja bem ... não há embasamento legal para isso. A Legislação prevê expressamente as causas de extinção do processo e morte iminente por aneurisma cerebral não se subsume em nenhuma delas</em>". (seu tom não foi irônico, o burocrata acreditava piamente no que acabava de dizer!)</div><div></div><br /><div>Aquela conversa já beirava o surreal... decidi que precisava de um café...</div><div></div><br /><div>Fui até a cozinha enchi o copo até as bordas... provei... estava forte, como todo café de serviço público deve ser... </div><div> </div><div></div><div>Tomando aquele copo inteiro era só uma questão minutos para eu ficar de bem com a vida até o fim do expediente.</div><br /><div></div><div>Voltei então para a sala principal da Repartição... e para minha surpresa a encontrei vazia... </div><div></div><br /><div>Agora era só eu em meio mesas em curvim, cadeiras giratórias, clipes, grampeadores, carimbos, tesouras cegas, colas e gominhas... Quando vazia, a desordenada e confusa Repartição, impunha respeito e medo... </div><br /><div></div><div>Aonde teriam ido o Chefe e o Oficial? </div><div> </div><div></div><div>Talvez decidiram voltar os dois ao hospital para levar a cabo a intimação antes que o morimbundo abotoasse o paletó... Se acretidasse em fantasmas, rezaria todas as noites para o espiríto daquele pobre homem voltar à terra para aterrorisar o frenesi do Chefe nas horas-mortas! </div><div></div><br /><div>Subitamente meu coração dispara... fico tonteado... e escuto passos.</div><div></div><br /><div>São passos fortes do Chefe pela Repartição...</div><div></div><br /><div><em>'É ele... É ele vindo me aterrorisar com inultilidades'</em>- pensei alto</div><div></div><br /><div>Olho ao redor e não vi nada. Mas escutava os passos do Chefe... Pude escutá-lo marchar deseperadamente sobre a Repartição, mas continuava não vendo nada. Seria isso real ou o café bateu em revertério? Isto acontece às vezes!</div><div></div><br /><div>Senti minha cabeça inchar, e pressão nas veias que irrigam meu cérebro subir vertiginosamente de uma hora para outra.</div><div></div><br /><div>Pensei em aneurismas... fantasmas... e joguei fora o resto do café... </div><br /><div></div><div><em>'o banheiro... rápido... o banheiro'</em>- era preciso vomitar aquela porcaria!</div>O Burrocratahttp://www.blogger.com/profile/07882809071894507284noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3401444964916031515.post-9158467758968011272009-04-14T18:53:00.001-07:002009-04-14T22:39:07.094-07:00As horas-mortas<a href="http://2.bp.blogspot.com/_7FVwkIKrvVs/SeVxOfA1SmI/AAAAAAAAAGQ/mV_oygj1RUc/s1600-h/buro5.bmp"><img style="MARGIN: 0px 10px 10px 0px; WIDTH: 200px; FLOAT: left; HEIGHT: 150px; CURSOR: hand" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5324786628092578402" border="0" alt="" src="http://2.bp.blogspot.com/_7FVwkIKrvVs/SeVxOfA1SmI/AAAAAAAAAGQ/mV_oygj1RUc/s200/buro5.bmp" /></a><br /><br />Já havíamos passado mais da metado do expediente.<br /><br />Adentravamos agora as horas-mortas...<br /><br />Os burocratas ancestrais há anos já falavam em "horas-mortas" para se referir ao período do expediente em que não há mais nada para fazer...<br /><br />É nessas horas que cabe a cada um vagabundar à sua própria maneira.<br /><br />Enquanto uns relêem pela quinta vez a mesma <em>Reader's Digest</em> que ronda as mesas desde o começo do ano... outros deitam a cabeça entre os braços e tentam inutilmente dormir... E os mais ousados fogem discretamente da Repartição para dar uma caminhada, fazer as unhas no salão, ou algo do tipo...<br /><br />E eu reparo assustado a agonia do nosso Chefe...<br /><br />Todos os dias nesse horário seu rosto se transforma... começa a suar frio... vai até a cozinha, pega um café e volta para sua mesa... suspira suspiros profundos... espalha alguns papéis na mesa só para depois reuni-los de volta... pega o telefone, pensa em algum número para discar, e depois coloca novamente no gancho... debate-se na cadeira tal qual peixe fora d'água...<br /><br />O pobre coitado era um workaholic em plena repartição pública... A metáfora do peixe lhe assenta perfeitamente!<br /><br />Ao contrário dos vagabundos, sofria a falta do que fazer...<br /><br />No começo, aquele desassossego face ao ócio e seu repugnante apreço pela burocracia causavam-me um asco intolerável... Por quantas vezes eu saíra para o banco, à lanchonete, à loteria só para evitar o vegetar sufocante daquele homem...<br /><br />Porém , com o tempo passei a entender e respeitar sua perspectiva da coisa toda...<br /><br />Ele penteava-se todo, passava o gel no cabelo, vestia calças e camisas impecavelmente limpas e passadas, e chegava à Repartição...<br /><br />E lá esperava todos os dias... o dia todo... uma ligação que nunca vinha... Esperava a ligação de uma espécie de <em>Roberto Justus</em> do serviço público...<br /><br />Um homem que fosse o próprio avatar da burocracia... Um homem com um plano meticuloso, estritamente guiado por procedimentos do mais genuíno e inflexível formalismo legal.<br /><br />Ele desejava fazer parte do plano desse homem; sonhava ser lançado numa odisséia burocrática de formulários, prazos, despachos, intimações, e maus tratos no balcão de atendimento...<br /><br />Acontece que esse dia até hoje não chegou... e ninguém está disposto a dizer ao Chefe que nunca chegará.<br /><br /><p>Não há trabalho a fazer por aqui... O trabalho nos esqueceu e nós esquecemos como trabalhar...</p>Ainda não tiveram coragem de dizer a ele que a Repartição é como um limbo... que apesar de bater ponto todo dia estamos aqui aposentados por invalidez... isso tudo aqui é uma Matrix... um faz de contas.<br /><br />Na Repartição a lógica da vagabundagem não admite suspensões ou derrogações.. É a triste realidade: por mais que o chefe queira mostrar eficiência ninguém verá.<br /><br />Um workaholic no serviço público...liderando uma corja de vagabundos a zanzar pela cozinha o dia inteiro... sempre o primeiro a chegar e o último a sair...<br /><br />O que posso fazer para ajudar esse cara?O Burrocratahttp://www.blogger.com/profile/07882809071894507284noreply@blogger.com12tag:blogger.com,1999:blog-3401444964916031515.post-72914175440259031692009-04-12T17:31:00.000-07:002009-04-12T23:20:12.069-07:00O inominável<a href="http://1.bp.blogspot.com/_7FVwkIKrvVs/SeLX19vRLmI/AAAAAAAAAGI/1We0b9O-4bI/s1600-h/buro.bmp"><img id="BLOGGER_PHOTO_ID_5324055031611207266" style="FLOAT: left; MARGIN: 0px 10px 10px 0px; WIDTH: 200px; CURSOR: hand; HEIGHT: 155px" alt="" src="http://1.bp.blogspot.com/_7FVwkIKrvVs/SeLX19vRLmI/AAAAAAAAAGI/1We0b9O-4bI/s200/buro.bmp" border="0" /></a><br /><div><div></div><div>Quando eu acordei já estava atrasado... Mais uma vez eu chegaria à Repartição ligeiramente fora do horário... até aí tudo bem!<br /><br />Mas para piorar as coisas ao abrir o guarda-roupas constatei que não haviam camisas limpas para vestir...<br /><br />Justo hoje que, excepcionalmente, eu cumpriria expediente no intimidador prédio sede... Com seu saguão em mármore... por onde os burocratas costumavam andar bem vestidos, diferentemente dos farrapos humanos da Repartição... O prédio sede era uma realidade igualmente vagabunda, porém mais elegante.<br /><br />Incrível... simplesmente não havia camisas.<br /><br />Foi então que abri a gaveta das meias e percebi que ainda tinha 2 únicas opções:<br /><br />Uma camisa de malha cinza, bem parecida com o uniforme usado pelos boys... e uma camisa estampada com uma grande folha verde na qual se lia: <em>La hoja de coca no es droga</em>!<br /><br />Cada camisa implicava um risco: ser confundido com um office-boy; ou passar um tempo em cana por fazer apologia às drogas...<br /><br />Era uma escolha cruel... Por fim, vesti a camisa cinza de boy e murmurei baixinho: <em>a sorte está lançada</em>!<br /><br />Os longos anos na Repartição acabaram com qualquer resquício de vaidade... Tanto é assim que certa feita já fui trabalhar vestindo uma calça de tactel...<br /><br />Deixo claro que a questão das camisas nada tinha a ver com estética.<br /><br />Para entender as nefastas consequências que poderiam acarretar caso eu fosse trabalhar usando a camisa de malha cinza, é preciso vislumbrar a demência institucional que se instalou no prédio sede desde a posse do último Diretor-Geral. Esse homem havia feito proibir os boys de usarem o elevador social .<br /><br />Como o elevador de serviço encontrava-se em conserto, esses pobres coitados arriscavam trincar as vértebras pelas escadas, levando nas costas processos que somavam quase seu próprio peso em papel...<br /><br />Enfim... quando cheguei à portaria do prédio sede, o saguão já estava vazio. Ninguém esperava pelo elevador... Um boy derretendo em suor passou por mim e seguiu pela escadaria.<br /><br />A semelhança da camisas com o uniforme era incrível.<br /><br />Mas eu estava decidido não subir aquelas escadas... pegaria o elevador com naturalidade. E se alguém viesse tirar satisfação dava logo uma carteirada!<br /><br />O elevador veio vazio... entrei... apertei o 12.<br /><br />Assim que começou a subir, um pânico de ser pego com aquela camisa me correu a espinha... Cruzei os braços por cima do peito e inclinei o tronco ligeiramente para baixo, diminuindo assim a área de contato visual... a visão da camisa cinza deveria ser evitada ao máximo...<br /><br />Enquanto os número passavam indicando os andares uma voz me coçava o peito: <em>vai... vai !</em><br /><em></em><br />Foi o 1° o 2° e o elevador começava a desacelerar antes de chegar ao 3° andar.<br /><br />Foi quando parou... as portas se abriram lentamente e me aparece nada mais nada menos que ele: o próprio Diretor-Geral em pessoa...<br /><br />Senti vertigens... e minha visão embaçou...<br /><br />Sua figura inteira não pude conceber... Tudo o que eu via eram recortes: um vulto gordo num terno impecável, uma papada suada, olheiras, cabelos transplantados, e uma boca de chupar ovo de onde escorria uma babinha...<br /><br />Eu estava agora no vórtice de um terror inominável...<br /><br />Aquele gordo estava por trás de tudo... Era o arquiteto de infinitas burocracias... Era um leviatã... um deus-burocrático...<br /><br />Ele abriu a boca gorda e suas palavras me ecoavam o cérebro:<br /><br />"<em>Você não deveria estar aqui</em>".<br /><br />Como eu previa, a camisa cinza o levava a me confundir com um boy...</div><div> </div><div>Eu poderia sem maiores complicações identificar-me como um burocrata da Repartição. Mas isso seria como admitir perante o supremo Diretor-Geral que: "<em>em algum momento na minha vida profissional algo deu errado e me perdi... e hoje eu sou um vegetal... A pior espécie dentre as quais pode ser encontrada nessa triste máquina que o Sr. dirige</em>...<br /><br />Vaidades não tenho... mas sobrou ainda algum orgulho que máquina do Sr. Diretor-Geral não conseguiu ainda moer.<br /><br />Saí cabisbaixo. "<em>Desculpe</em>"- eu disse ao passar por sua disforme figura. Não sei explicar porque, mas preferi que ele continuasse pensando que eu fosse mesmo um boy...<br /><br />As portas do elevador se fecharam e levaram o Diretor-Geral...<br /><br />Em estado de choque, eu fantasiava o elevador subindo até o último andar... E continuando a subir, estraçalhando a lage do prédio e voando até as nuvens levando suavemente aquele gordo pelas alturas...<br /><br /><em>Eu devia ter peidado lá dentro</em>, pensei.</div></div>O Burrocratahttp://www.blogger.com/profile/07882809071894507284noreply@blogger.com11tag:blogger.com,1999:blog-3401444964916031515.post-33267703127412119902009-04-08T09:14:00.000-07:002009-04-09T07:32:52.953-07:00Onde os velhos não tem vez<a href="http://1.bp.blogspot.com/_7FVwkIKrvVs/Sd1VSDqRiYI/AAAAAAAAAF4/fhLG_oOWen0/s1600-h/no+country+for+old+men.jpg"><img style="MARGIN: 0px 10px 10px 0px; WIDTH: 142px; FLOAT: left; HEIGHT: 200px; CURSOR: hand" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5322504103330417026" border="0" alt="" src="http://1.bp.blogspot.com/_7FVwkIKrvVs/Sd1VSDqRiYI/AAAAAAAAAF4/fhLG_oOWen0/s200/no+country+for+old+men.jpg" /></a><br /><div>Páscoa, Festa Junina e Natal: por três vezes ao ano os vagabundos abriam uma certa caixa azul e tiravam dali uma infinidade de bugingangas, todas mofadas e desbotadas...</div><br /><div></div><div>É que na absoluta falta do que fazer, o Setor de Recursos Humanos se reunia com as chefias e as orientava a decorar as Repartições para as festividades...</div><div></div><br /><div>De acordo com a psicologia barata constantemente pregada pelos lunáticos do RH, os servidores se sentiriam mais felizes e valorizados na Repartição se se pendurasse pelas paredes posteres do coelhinho da páscoa; papai-noel; e bandeirinhas coloridas...</div><br /><div></div><div>Eu tinha uma teoria diferente: as decorações na Repartição, só trazem mais constrangimento e baixa-estima aos servidores, na medida em que infantilizam a única coisa que a eles confere certa dignidade- a esterelidade, graveza e sobriedade do ambiente burocrático...</div><br /><div></div><div>Todo ano era a mesma estória, e esse ano não seria diferente...</div><br /><div></div><div>Não escapamos ao constrangimento das paredes repletas de coelhinhos de pelúcia encardidos e dos ovinhos plásticos velhos e descascados se exibindo vergonhosamente sobre as mesas.</div><br /><div></div><div></div><div>Como se pedisse desculpas pelo rídiculo espetáculo, o chefe chegou com uma sacola cheia de chocolates para fazer uma média com os vagabundos... </div><div></div><div>Todos comemos bastante , principalmente o Sr. D, um velhinho tarado que sofria de diabetes... </div><div></div><br /><div>Enquanto todos detonavam o ovo de chocolate, chegou ao balcão de atendimento uma advogada em terninho preto, dona de belo sorriso, um corpo esguio, cabelos esvoaçantes... tanto os vagabundos quanto as vagabundas conchichavam: <em>é ou já foi modelo... com certeza!</em></div><div><em></em></div><br /><div>Já com a glicose nas alturas, e com o cérebro já bastante cafeinado, o velho D. ouriçou-se todo... </div><br /><div></div><div>Ajeitou a camisa para dentro das calças... limpou a boca muxibenta suja de chocolate... abotoou o paletó... endireitou a postura... e seguiu solenemente para o balcão de atendimento.</div><div></div><br /><div>Disposto a impressionar, gritou desdenhosamente em direção à cozinha, onde os outros vagabundos se entupiam com bombons: <em></em></div><div><em></em></div><br /><div><em>"Os autos de impugnação devem aguardar o sobrestamento- digam isso ao Juiz".</em></div><br /><div><em></em></div><div>Os vagabundos ficaram sem entender nada... apenas olharam-se em reprovação como se pensassem todos a mesma coisa:<em> "a libido acaba com o que sobrou da dignidade de qualquer homem velho".</em></div><div><em></em></div><br /><div>No balcão, a linda moça tinha os olhos fixos em algo que se posicionava logo atrás do Sr. D... Parecia imersa em algum pensamento feliz, era como se o Sr. D não existisse.</div><div></div><div></div><div>E ele esforçava-se por lapidar bem as palavras: "<em>Senhorita, entenda que os procedimentos cartorários ordenam que eu lhe peça que apresenta a..."</em></div><div><em></em></div><br /><div>Em transe a advogada arregalha os olhos e irrompe num urro esganiçado: <em></em></div><div><em></em></div><br /><div><em>"aiiiiiiiiiiiiiii... que coelhinho lindo! Onde vocês compraram esse poster?"</em></div><div><em></em></div><br /><div>O velho dá um pulo e quase sofre um ataque cardíaco... E aos poucos, constatada a insignificância do burocrata de fala difícil face o coelhinho da páscoa, seu rosto foi murchando...</div><div></div><div></div><div>A coisa descambou mesmo quando vieram juntas da cozinha três vagabundas lambuzadas oferecendo à advogada grandes nacos de chocolate derretido: </div><br /><div></div><div>"<em>menina adoro chocolate... que coelhinho lindo esse aí! quero um pra mim..."</em></div><div><em>"nossa você não faz regime? Que inveja</em>!"...</div><br /><div><em></em></div><div>A partir de então, as três vagabundas assumem o atendimento da linda moça numa orgia de fofoca regada a muito chocolate...</div><br /><div></div><div>O Sr. D, encolhido e cabisbaixo, rumou desconsolado para a cozinha... </div><br /><div></div><div>No caminho derrubou com um safanão o enfeite colorido que enfeitava sua mesa: </div><div></div><br /><div><em>"Páscoa de merda</em>!", esbravejou o velho.</div><br /><div></div><div>Foi até o quintal e acendeu um cigarro... a cada tragada seu rosto murchava mais um pouco... sua glicose estava agora no pico...</div><br /><div></div><div>Estralando a coluna pensava: <em>"nesse mundo colorido, de lindas advogadas; de coelhinhos saltitantes; e pessoas alegremente comungando do mesmo chocolate, não há lugar para um burocrata velho e diabético</em> ...".</div>O Burrocratahttp://www.blogger.com/profile/07882809071894507284noreply@blogger.com5tag:blogger.com,1999:blog-3401444964916031515.post-63225442261382223832009-04-06T22:26:00.000-07:002009-04-06T23:58:35.336-07:00Águas de março<a href="http://2.bp.blogspot.com/_7FVwkIKrvVs/Sdr0smGvJEI/AAAAAAAAAFw/gFPkNwjXNsA/s1600-h/polvo.jpg"><img style="MARGIN: 0px 10px 10px 0px; WIDTH: 122px; FLOAT: left; HEIGHT: 160px; CURSOR: hand" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5321834956671886402" border="0" alt="" src="http://2.bp.blogspot.com/_7FVwkIKrvVs/Sdr0smGvJEI/AAAAAAAAAFw/gFPkNwjXNsA/s200/polvo.jpg" /></a><br /><div>Hoje na Repartição flagrei a vagabunda da Sra. V assoviando baixinho o <em>Samba da Benção</em> de Vinícius de Moraes enquanto ela carimbava um calhamaço qualquer de folhas.</div><br /><div></div><div>Tenho que confessar que a Sra. V é a pior servidora pública que já cruzou meus caminhos. </div><div></div><br /><div>Essa Sra. faz tudo errado uma primeira vez... aí o chefe manda que ela refaça, mas ela erra tudo novamente... então o chefe desiste e passa o serviço da Sra. V para eu fazer.</div><div></div><br /><div>Tanto é assim que quando a vi carimbando aquela pilha de papel, já separei meus carimbos e repus a tinta da minha almofada. Fui tomar um café aguardando o inevitável...</div><br /><div></div><div>Mas uma coisa devo admitir: a Sra. V é das assoviadoras a melhor, sem dúvidas...</div><br /><div></div><div>A fluidez com a qual ela concateava a melodia era cativante. Podia-se ver que ela colocava toda a alma nos seus assovios... </div><br /><div></div><div>Da cozinha, com um copo de café na mão pus-me a ouvir mais atentamente o <em>Samba da Benção</em> assoviado pela Sra. V... Enquanto isso meus olhos fitavam aflitos a cada carimbada que a Sra. V desferia... <em>Ela tá errando tudo, tenho certeza que ela tá errando,</em> pensava eu.</div><div></div><br /><div>Acabei o café e corri então para minha mesa... Pensei que quanto mais rápido eu recarimbar aquelas folhas, mais rápido poderia cascar fora dali. Afinal, eu decidira desde o começo do dia que eu teria um ataque de dor nos intestinos durante o expediente, e iria embora antes do fim do expediente...</div><div> </div><div> </div><div></div><div></div><div></div><div></div><div>Foi então que o chefe rumou para a mesa da Sra. V.... E não acreditou no que vira... Para sua surpresa o que ela vinha fazendo estava em ordem... E nessa exato momento começou a chover lá fora...</div><br /><div></div><div>Do nada senti uma alegria inquietante. Levantei-me, segui até a mesa da Sra. V, e abri um largo sorriso: <em>A senhora assovia com muita graça</em>! </div><div></div><br /><div>Ao ouvir isso o rosto da Sra. V rejuvenesceu 20 anos, e ela sorriu de volta mostrando os dentes todos amarelos e tortos.</div><br /><div></div><div>Virei-me de costas, e ela voltou a carimbar... assoviava agora Á<em>guas de Março...</em> </div><div> </div><div></div><div><em></em></div><div>Às vezes tudo do que nós só precisamos é de um incentivo, um elogio, uma palavra de fé...</div>O Burrocratahttp://www.blogger.com/profile/07882809071894507284noreply@blogger.com7tag:blogger.com,1999:blog-3401444964916031515.post-24599053531088209692009-04-05T14:51:00.000-07:002009-04-05T19:01:11.363-07:00Resultado da enquete musical<a href="http://3.bp.blogspot.com/_7FVwkIKrvVs/SdlhKBJvdQI/AAAAAAAAAFo/T4OyuywrtJ0/s1600-h/t2294277222_229f6899a9a.jpg"><img style="MARGIN: 0px 10px 10px 0px; WIDTH: 200px; FLOAT: left; HEIGHT: 179px; CURSOR: hand" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5321391259450832130" border="0" alt="" src="http://3.bp.blogspot.com/_7FVwkIKrvVs/SdlhKBJvdQI/AAAAAAAAAFo/T4OyuywrtJ0/s200/t2294277222_229f6899a9a.jpg" /></a><br /><div><div>Encerrou-se a enquete musical!</div><div></div><div></div><div>Respondendo à pergunta: Qual é o hino das repartições públicas?</div><br /><div></div><div>O Resultado foi o seguinte:</div><br /><p align="justify"><span style="font-size:85%;"><em>Sultans of Swing - Dire Straits: 3 votos / </em></span><span style="font-size:85%;"><em>Hunting high and low - A-HA: 2 votos / </em></span><span style="font-size:85%;"><em>I started a joke - Bee Gees: 2 votos / </em></span><span style="font-size:85%;"><em>Say you say me - Lionel Richie: 1 voto / </em></span><span style="font-size:85%;"><em>Feelings - Morris Albert: 1 voto / </em></span><span style="font-size:85%;"><em>Another day in paradise - Phil Collins : 0 votos / </em></span><span style="font-size:85%;"><em>Rocket Man - Elton John: 0 votos / </em></span><span style="font-size:85%;"><em>Woman in chains - Tear for Fears: 0 votos / </em></span><span style="font-size:85%;"><em>It must have been love - Roxette: 0 votos / </em></span><span style="font-size:85%;"><em>Tears in Heaven - Eric Clapton: 0 votos</em></span></p><div>Confesso que não esperava tal resultado.</div><br /><div></div><div>A votação pífia de Sir Elton John, e o voto computado em favor de Lionel Richie pegaram-me de surpresa...</div><div><br />Fato é que a voz do povo é a voz de Deus... E o povo decidiu por 3 votos que <em>Sultans of Swing,</em> da banda britânica <em>Dire Straits </em>é o hino das repartições públicas brasileiras. Ou seja, é a música mais tocada pelas rádios nas quais os burocratas se sintonizam durante o expediente... </div><br /><div>Obrigado aos participantes... E vamos à próxima enquete vagabunda que versará sobre os vilões do serviço público.</div></div>O Burrocratahttp://www.blogger.com/profile/07882809071894507284noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-3401444964916031515.post-71915171514283355492009-04-02T21:01:00.000-07:002009-04-02T23:21:16.543-07:00Aprendiz de vagabundo<a href="http://2.bp.blogspot.com/_7FVwkIKrvVs/SdWqsUThS-I/AAAAAAAAAFQ/xlMoznOt9Vc/s1600-h/ccc076299e936748.jpg"><img style="MARGIN: 0px 10px 10px 0px; WIDTH: 89px; FLOAT: left; HEIGHT: 125px; CURSOR: hand" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5320346213149658082" border="0" alt="" src="http://2.bp.blogspot.com/_7FVwkIKrvVs/SdWqsUThS-I/AAAAAAAAAFQ/xlMoznOt9Vc/s200/ccc076299e936748.jpg" /></a><br /><div>A Secretaria de Informática resolveu bloquear o acesso ao portal da globo.com, a blogs e a sites de games em geral...</div><div></div><br /><div>Tal arbitrariedade causou rebuliço sem precedentes entre os vagabundos...</div><br /><div></div><div>Formou-se uma cadeia de solidariedade que até então eu nunca tinha visto antes na Repartição...</div><div></div><br /><div>Burocratas nunca foram muito solidários, tampouco organizados... a última tentativa de greve ilustra isso bem. Lembro-me claramente daquela cena lamentável: meia dúzia de vagabundos vestindo preto, usando bottons "aumento já", e soprando apitos em frente o prédio sede.</div><br /><div></div><div>A reação à restrição do uso da internet na Repartição fora bastante diferente... Para minha surpresa todas aquelas vozes preguiçosas se uniram em solidariedade aos burocratas-internautas.</div><br /><div></div><div>Lametaram a sorte da vagabunda que recentemente pagara uma nota por uma conta num site de buraco on-line; a da noiva que não sabia cozinhar, e agora corria atrás do tempo perdido imprimindo as receitas da Ana Maria Braga... e a de tantos outros.</div><div></div><br /><div>Minha preocupação maior era com o fim das postagens "<em>in loco</em>"... o que comprometeria a qualidade do blog...</div><div></div><br /><div>Alguns dias mais tarde veio à tona o motivo daquela louca decisão: ao final do expediente, naquelas horas-mortas em que a Repartição começava a esvaziar, um boy menor de idade havia sido pego em flagrante se masturbando na sala do Juiz enquanto acessava sites de pornografia pesada.</div><br /><div></div><div>Isso de certa forma tranquilizou os vagabundos... </div><br /><div></div><div>Então aquilo tudo não era uma investida em prol da eficiência do serviço público, mas sim uma resposta a um fato isolado... </div><div></div><br /><div>Então o problema era de fácil solução! Abriu-se um processo administrativo contra aquele jovem... </div><div></div><br /><div>Não foi difícil demonizar o pobre coitado... Ele era o mesmo boy que na festa de fim de ano havia enchido a cara de uísque; dançado rala-coxa com a namorada do Juiz; e vomitado nas escadas da Repartição. </div><br /><div></div><div>Restou então comprovado: era mesmo um delinquente... e não poderia trabalhar mais lá.</div><br /><div></div><div>Pronto... resolvido o problema. Nada mais justificava proibir o acesso à Internet em função de um só pivete que não sabia usar um computador com moderação e responsabilidade.</div><div></div><br /><div>Por um lado fico contente em poder eventualmente jogar um pac-man e atualizar o blog...</div><div></div><br /><div>Mas sinto um nó na garganta ao olhar para a mesa do boy e vê-la vazia... Ele costumava ficar na dele... sentado ali o dia inteiro a desenhar carros tunados e a mandar mensagens pelo celular. No final do expediente, ele vinha me pedir ajuda com o para-casa de inglês...</div><div></div><br /><div>Era um cara legal... mas exagerou na dose. </div><div></div><br /><div>Por que ele tinha que fazer aquela idiotice? </div>O Burrocratahttp://www.blogger.com/profile/07882809071894507284noreply@blogger.com9tag:blogger.com,1999:blog-3401444964916031515.post-32514414846690523182009-03-31T22:48:00.000-07:002009-04-01T21:50:55.076-07:00Militar, cristão e escroto.<a href="http://4.bp.blogspot.com/_7FVwkIKrvVs/SdQqYgj30uI/AAAAAAAAAFI/RB4URaryTuM/s1600-h/Burocrata04.jpg"><img style="MARGIN: 0px 10px 10px 0px; WIDTH: 173px; FLOAT: left; HEIGHT: 200px; CURSOR: hand" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5319923660377019106" border="0" alt="" src="http://4.bp.blogspot.com/_7FVwkIKrvVs/SdQqYgj30uI/AAAAAAAAAFI/RB4URaryTuM/s200/Burocrata04.jpg" /></a><br /><div><div><a href="http://1.bp.blogspot.com/_7FVwkIKrvVs/SdQqJPNuAEI/AAAAAAAAAE4/5U8CqhQK0tQ/s1600-h/buro4.jpg"></a><div>O Sr. C havia abandonado a carreira militar após o advento da Constituição de 88.<br /><br />Não lhe convinha, após o declínio do prestígio do exército, continuar madrugando e recebendo pouco sem poder eventualmente descontar suas frustrações em um estudante univesitário qualquer.<br /><br />Foi então que resolveu virar burocrata. Prestou concurso público e passou... Agora continua recebendo pouco, mas pode acordar tarde e complicar a vida de alguém atrasando pedidos de certidões e coisas do tipo.<br /><br />Mas o que a estória de vida do Sr. C ilustra é como é gigantesco o potencial do ser humano para inventar mil e uma formas de fuder com a vida alheia.<br /><br />Alguns meses depois de tomar posse, a disciplina e dedicação do Sr. C lhe rendera um cargo de chefia. Dentre suas atribuições estava a de coordenar o trabalho dos vigias noturnos que faziam a ronda do prédio.<br /><br />Esses vigias noturnos não eram servidores públicos e sim funcionários de uma empresa terceirizada. Esses heróis aguentavam toda a encheção de saco dos chefes do serviço público e ainda todas picaretagens da empresa, que embolsava parte de seus vales-transportes e alimentação.<br /><br />E não é preciso ser um gênio da administração para saber que empregados submetidos à condições extremas tem o prazer em fazer tudo a seu alcance para avacalhar com seus chefes.<br /><br />Mas esses vigias até que eram inofensivos. Só tinham um defeito: dormiam o expediente inteiro... Ora, até aí tudo bem...<br /><br />Mas é claro o Sr. C, com as rabugices de um ex-militar, não permitiria isso nunca. E assim, logo na primeira semana à frente da chefia, arquitetou seu plano macabro.<br /><br />Mandou instalar no prédio inteiro 8 relógios de ponto em locais distintos. Ordenou que a partir de então a cada hora de serviço passada, cada dos vigia deveria bater o ponto em um relógio diferente.<br /><br />E no mesmo dia em que estabeleceu as novas regras, o Sr. C mandara rezar na paróquia uma missa pela segurança das repartições públicas, e distribuiu santinhos entre os vigias.<br /><br />De acordo com aqueles pobres diabos "<em>o Sr. C tinha conseguido fuder bonito a bicicleta e para isso ainda tinha colocado Deus no meio".</em><br /><br />Mas se a inteligência do Sr. C foi grande, maior ainda foi a dos vigias.<br /><br />Logo no começo do expediente noturno, eles desparafuzavam os relógios de ponto das paredes e colocavam sobre uma grande mesa.<br /><br />E assim que batia a hora certa de cada relógio, eles não precisavam fazer a ronda... bastava bater o ponto nos relógios que já estavam sobre a mesa... Cada dia, um vigia era sorteado para ficar acordado batendo o ponto enquanto os outros dormiam tranquilos... Ao final do expediente era só parafusar o relógio novamente no lugar. </div><div><br />Quanto a pessoas como Sr. C confesso que continuo não as entendendo... O que elas querem no fim das contas? Por que elas existem?<br /><br />Pensando sobre essas perguntars me pego imaginando o Sr. C...<br /></div><div>Imagino-o sozinho em casa, vestindo o pijama; escovando o bigode; deitando numa estreita cama de solteiro; sonhando com vigias noturnos a rondar pelos corredores... todos eles zelando gloriosos pela segurança das repartições públicas.</div></div></div>O Burrocratahttp://www.blogger.com/profile/07882809071894507284noreply@blogger.com6tag:blogger.com,1999:blog-3401444964916031515.post-54788195535229340402009-03-31T19:14:00.000-07:002009-03-31T22:06:24.787-07:00"Levantar mais cedo para ficar mais tempo à toa" ou "The rat race"<a href="http://3.bp.blogspot.com/_7FVwkIKrvVs/SdL1QlyEZqI/AAAAAAAAAEo/x3XUp-xiJos/s1600-h/reloj2.jpg"><img style="MARGIN: 0px 10px 10px 0px; WIDTH: 200px; FLOAT: left; HEIGHT: 158px; CURSOR: hand" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5319583775246804642" border="0" alt="" src="http://3.bp.blogspot.com/_7FVwkIKrvVs/SdL1QlyEZqI/AAAAAAAAAEo/x3XUp-xiJos/s200/reloj2.jpg" /></a><br /><div>Hoje recebi de um servidor público o seguinte texto que orgulhosamente apresento, com pequenas alterações, aos raros e caros leitores desse blog mofado.</div><br /><div></div><div>É incrível constatar nos relatos de outros burocratas a existência de uma identidade vagabunda ligando todos nós servidores públicos. À parte as diferenças nos criativos nomes dos cargos: oficiais de justiça, técnicos administrativo, analista de gabinete, etc; somos todos farinha do mesmo saco... sem tirar nem por.</div><br /><div></div><div>O título dado pelo autor é "levantar mais cedo para ficar mais tempo à toa"... mas eu tomei a liberdade de acrescentar um outro título alternativo "The rat race".</div><br /><div></div><div>Segue o texto: </div><br /><div></div><div>"<em>A barra magnética do crachá estava falhando. De forma que tive que fazer várias tentativas de passar pela roleta.</em></div><div><em></em></div><br /><div><em>Concentrado no crachá... limpando e lustrando a barra magnética, senti um suspiro esbaforido ofegando bem na minha orelha e nuca.</em></div><br /><div><em></em></div><div><em>Assustado, girei o corpo e me deparei com a dona de um semblante aflito e atônito a me olhar fixamente...</em></div><div><em></em></div><br /><div><em>Meu Deus... que pensamentos faziam-na tensionar o rosto em ódio e aflição daquela forma? </em></div><br /><div><em></em></div><div><em>Passei sofregamente pela catraca e me senti aliviado por deixar para trás aquela do rosto enervado.</em></div><div><em></em></div><br /><div><em>Mais à frente no corredor, eu deveria passar a tarja magnética do crachá pelo relógio de ponto. E para lá segui.</em></div><div><em></em></div><br /><div><em>Mas senti atrás de mim aquele esbaforido nervoso me seguindo pelo corredor. </em></div><div><em></em></div><br /><div><em>Os passos eram ágeis. Senti que o rosto enervado me alcançaria inevitavelmente no próximos passos... Senti medo e aflição.</em></div><div><em></em></div><br /><div><em>Levantei o crachá e trêmulo levei às mãos em direção ao relógio de ponto. Foi quando num gesto rápido a estressada se jogou na minha frente, e com a desenvoltura de uma pata choca andando sobre scapins logrou marcar o ponto antes de mim.</em></div><br /><div><em></em></div><div><em>Enquanto eu tentava entender o motivo de tamanho desvairio e ódio, a personagem lançou-me um olhar triunfante e suspirou aliviada...</em></div><div><em></em></div><br /><div><em>Ela havia conseguido... que vitória a dela... passando na minha frente feito louca havia ganhado 2 ou 3 minutos na folha de ponto.</em></div><br /><div><em></em></div><div><em>Entraria mais cedo e ficaria mais tempo à toa o resto do dia."</em></div>O Burrocratahttp://www.blogger.com/profile/07882809071894507284noreply@blogger.com4tag:blogger.com,1999:blog-3401444964916031515.post-53951165325166999682009-03-30T18:35:00.000-07:002009-03-30T20:04:21.245-07:00A dança das gavetas<a href="http://3.bp.blogspot.com/_7FVwkIKrvVs/SdGH1euugkI/AAAAAAAAAEg/YlGoNwskgk0/s1600-h/buro1.bmp"><img style="MARGIN: 0px 10px 10px 0px; WIDTH: 148px; FLOAT: left; HEIGHT: 200px; CURSOR: hand" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5319181987753132610" border="0" alt="" src="http://3.bp.blogspot.com/_7FVwkIKrvVs/SdGH1euugkI/AAAAAAAAAEg/YlGoNwskgk0/s200/buro1.bmp" /></a><br /><div>"<em>Limpem hoje mesmo todas as suas gavetas</em>", ordenou o chefe. </div><br /><div></div><div>Logo pensei: "<em>Finalmente seremos despedidos... A razão triunfou e perceberam nossa inutilidade... Extinguirão a Repartição inteira em nome da eficiência e da moralidade... Demolirão esse prédio velho e mofado e construirão um parque em seu lugar".</em></div><div><em></em></div><br /><div>Como de costume eu estava equivocado.</div><div></div><br /><div>Deveríamos desocupar as gavetas pois pela manhã do dia seguinte as mesas seriam trocadas por modelos mais modernos.</div><br /><div></div><div>Havia gostado tanto da troca das cadeiras (ver o post "<em>A dança das cadeiras</em>"). No entanto, essas mesas me cheiravam a superfaturamento e licitações fraudadas. Afinal, de onde eles tiravam, em tempos de crise, tanto dinheiro para remobiliar todas as repartições? </div><br /><div></div><div>Por outro lado, por que não dar uma boa repaginada na boa e velha repartição? Ora o que havia de tão errado nisso?</div><br /><div></div><div>Só porque as pessoas que trabalham aqui são feias e relapsas não quer dizer que os móveis também devam ser feios e de má qualidade...</div><br /><div></div><div>Alternado um misto de preguiça e desinteresse comecei então a empacotar as tralhas que ocupavam minhas gavetas.</div><br /><div></div><div>Havia de tudo um pouco ali... </div><br /><div></div><div>Papéis e documentos de todo tipo, colas com data de validade vencida, tesouras cegas, cupons de desconto para o <em>China in Box</em>, uma cartela de <em>Finasterida</em> pela metade, e até mesmo um preservativo intocado que deveria estar há ali anos...</div><br /><div></div><div>Levei a tarde toda para ordenar e retirar aquilo tudo da gaveta. Mas no fim das contas até que fiquei satisfeito e orgulhoso com o trabalho que havia feito...</div><br /><div></div><div>Aquela tralha toda sistematicamente organizada dentro de uma caixa, me abrira o apetite... Fui então comer minha esfirra com mate-couro...</div><br /><div></div><div>Fora da Repartição, eu agora eu pensava sobre as mesas novas... Seriam verdes tal qual as cadeiras novas? Teriam elas suporte para copos de café? Seria o desing curvo?</div><br /><div></div><div>Voltei do lanche com as energias renovadas e grandes espectativas em relação à troca... </div><br /><div></div><div>Notei que agora as mesas antigas tinham uma etiqueta onde se lia "RECOLHER". Haviam colado essa etiqueta em todas as mesas, com exceção da minha. Na minha, a etiqueta dizia em letras garrafais: "NÃO RECOLHER".</div><div></div><br /><div>Foi então que a ficha caiu...</div><br /><div></div><div>Então todo o trabalho que eu havia feito durante o expediente inteiro fora em vão? E minha mesa fora a escolhida para continuar vegetando junto a nós por mais alguns anos?</div><br /><div></div><div>Até que nem fiquei estressado com isso tudo! </div><div></div><br /><div>Afinal, todos os dias o trabalho que eu faço é mesmo em vão... E todo mundo vive dizendo por aí que não se fazem mais mesas como antigamente... </div>O Burrocratahttp://www.blogger.com/profile/07882809071894507284noreply@blogger.com8tag:blogger.com,1999:blog-3401444964916031515.post-24226342940033307322009-03-28T15:24:00.000-07:002009-03-29T13:31:07.439-07:00Resultado da 1ª enquete vagabunda<a href="http://1.bp.blogspot.com/_7FVwkIKrvVs/Sc_N4Zqet-I/AAAAAAAAAEQ/gC4F6IhVYb8/s1600-h/rsz_2294277222_229f6899a9.jpg"><img id="BLOGGER_PHOTO_ID_5318696053793273826" style="FLOAT: left; MARGIN: 0px 10px 10px 0px; WIDTH: 200px; CURSOR: hand; HEIGHT: 179px" alt="" src="http://1.bp.blogspot.com/_7FVwkIKrvVs/Sc_N4Zqet-I/AAAAAAAAAEQ/gC4F6IhVYb8/s200/rsz_2294277222_229f6899a9.jpg" border="0" /></a> <div></div><div>Restou constatado em nossa primeira enquete que os servidores do Judiciário são os mais vagabundos entre os 3 poderes...</div><br /><div></div><div></div><div>Respondendo à pergunta: <em>Quais são os funcionários públicos que trabalham menos?;</em> o resultado foi o seguinte: </div><br /><p>Executivo: 5 votos/ Legislativo: 4 votos/ Judiciário: 6 votos</p><p>Foi realmente uma disputa muito emocionante. </p><div>Nos primeiros dias o Executivo saiu na frente. Mas hoje, às vésperas do encerramento da enquete estavam empatados Executivo e Judiciário em 5 votos...</div><div></div><br /><div>Sofri de um dilema interno muito forte: na condição de moderador do blog deveria manter a neutralidade; por outro lado, o servidor público dentro de mim, clamava as glórias vagabundas de anos de Repartição...</div><br /><div></div><div>Pensei no trabalho árduo daqueles que atuam na seara da educação em condições incrivelmente adversas. E o contrapus aos <em>jurocratas</em> vegetando sob o ar condicionado e nos seus sindicatos reclamões... Dei então o voto de minerva.</div><div></div><br /><div>Obrigado a esses 14 nobres leitores que opinaram nessa enquete.</div><br /><div></div><div>Nossa próxima enquete versará sobre as preferências musicais dos vagabundos públicos... aguardem!</div>O Burrocratahttp://www.blogger.com/profile/07882809071894507284noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-3401444964916031515.post-77420234030577619782009-03-27T04:56:00.000-07:002009-03-27T05:25:33.294-07:00Agonia e glória<a href="http://1.bp.blogspot.com/_7FVwkIKrvVs/SczFY1BT-0I/AAAAAAAAAEI/NqnEkkdT-Aw/s1600-h/449885331_36bb2e5cc21.jpg"><img style="MARGIN: 0px 10px 10px 0px; WIDTH: 148px; FLOAT: left; HEIGHT: 200px; CURSOR: hand" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5317842290357828418" border="0" alt="" src="http://1.bp.blogspot.com/_7FVwkIKrvVs/SczFY1BT-0I/AAAAAAAAAEI/NqnEkkdT-Aw/s200/449885331_36bb2e5cc21.jpg" /></a><br /><div>Hoje, por volta da metade do expediente, constatei que o café da garrafa térmica vermelha havia acabado. Restava somente o café àquela altura já frio da garrafa azul, cuja vedação apresentava problemas irreversíveis...</div><br /><div></div><div>Adiantando meus pensamentos, a vagabunda, que fumava sofregamente no quintal, antecipou-se: "<em>acabo o pó de café também... não dá para fazer mais".</em></div><div></div><br /><div>Isso significava que só tínhamos uma alternativa: "abrir um chamado" para a SGA- Seção de Gestão Alimentícia (ou vulga Cantina), solicitando uma garrafa de café passado na hora...</div><br /><div></div><div>É senso comum entre todos da Repartição que solicitações de café à SGA devem ser evitadas a todo custo...</div><br /><div></div><div>A praxe interna manda que os funcionários façam uma caixinha mensal para comprar um pó de café aceitável; e que eles mesmos o passe na cozinha da Repartiçao.</div><div></div><br /><div>Costuma-se assim fazer pois a SGA usa pó ruim... alguns dizem que é "Café do Bule" outros que é "Mellita"... não se sabe ao certo. Qualquer dia desses vou ligar lá para a SGA para tirar essa dúvida.</div><div></div><br /><div>Além da qualidade duvidável do pó, a SGA faz o café em escala industrial . Usam-se galões gigantes de alumínio, nos quais se mistura com uma pá grandes quantidades de açucar.</div><br /><div></div><div>O resultado desse processo é um café ralo e muito doce. Tanto é assim que o apelidaram-no "chá de café". </div><div></div><br /><div>E desse chá eu não estava disposto a beber.</div><div></div><br /><div>Por outro lado como poderíamos vegetar a outra metade do expediente sem café, por pior que fosse ele?</div><div></div><br /><div>Enquanto eu lamentava o café ausente, o <em>Sr. J</em> entrou triunfantemente pela porta da cozinha.</div><br /><div></div><div>Ele trazia em uma mão um saco de pães e na outra uma garrafa 2l de Coca-Cola.</div><br /><div></div><div>Dividimos fraternalmente aquele lanche. Entre mordidas, goles e tímidos sorrisos de agradecimento ao <em>Sr. J,</em> olhavamos anestesiados para o chão em silêncio. </div><br /><div></div><div>Imperava uma atmosfera solene.</div><br /><div></div><div>Coca-Cola é tipo um café gelado, pensei...</div><div></div><br /><div>A vagabunda já tirava outro cigarro do maço: "<em>e o cafezim? preciso fazer uma boca de pito</em>"!</div>O Burrocratahttp://www.blogger.com/profile/07882809071894507284noreply@blogger.com4